PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Nº 5026007-91.2023.4.03.6183 / 5ª Vara Previdenciária Federal de São Paulo
AUTOR:
Advogados do(a) AUTOR: ERACI NUNES CASTRO DA ROSA - SC34324, KELLY CRISTINA DOS SANTOS LOPES ABUGATTAS - SC20918, MOISES DOS SANTOS - SC44713
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) REU: ISABEL CRISTINA BAFUNI - SP224760
S E N T E N Ç A
Vistos, em sentença.
A parte autora em epígrafe, devidamente qualificada nos autos, ajuizou a presente ação, sob rito ordinário, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando obter provimento jurisdicional que determine o reconhecimento de tempo de serviço exercido sob condições especiais, com a sua conversão em tempo comum, para fins de revisão do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/195.553.094-4, que recebe desde 29/08/2019.
Aduz, em síntese, que a Autarquia-ré deixou de considerar como especiais os períodos de 01/11/2005 a 23/11/2007 (ASSOCIAÇÃO SAÚDE DA FAMÍLIA), 11/02/2008 a 21/05/2010 (SPDM – CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSOCIAL – CAPS ITAPEVA), 24/08/2015 a 26/07/2018 (ASSOCIAÇÃO EDUCACIONAL NOVE DE JULHO) e de 20/06/2016 a 09/05/2019 (SPDM – UNIDADE RECOMEÇO HELVETIA), sem os quais não obteve êxito na concessão do benefício mais vantajoso.
Com a petição inicial vieram os documentos.
Determinada a suspensão do feito com base na decisão proferida pelo E. Supremo Tribunal Federal em sede de embargos de declaração no bojo do RE 1276977 – Tema de Repercussão Geral 1102 (Id 311714511), a decisão foi reconsiderada (Id 335933391).
Emendada a petição inicial (Ids337253142, 337253147 e 337253148) e comprovado o recolhimento das custas judiciárias (Id 340484326).
Devidamente citada, a Autarquia-ré apresentou contestação, na qual arguiu pela improcedência do pedido (Id 343372033).
Houve réplica, que remeteu aos argumentos apresentados na petição inicial e aduziu não haver mais provas a serem produzidas (Id 345487254).
O processo foi redistribuído ao Juízo da 5ª Vara Previdenciária Federal em razão da extinção da 1ª Vara Previdenciária Federal, na qual originalmente tramitava.
É o relatório do necessário. Passo a decidir, fundamentando.
Presentes os pressupostos processuais e as condições da ação, passo ao exame do MÉRITO da demanda.
- Da aposentadoria especial -
O direito à aposentadoria especial encontra fundamento de validade no artigo 201, § 1º, da Carta Magna, que, ao tratar do Sistema Previdenciário Brasileiro, afastou, no referido artigo, a utilização de critérios diferenciados para fins de concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, “ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar” (redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98, posteriormente alterada pela Emenda Constitucional nº 47, de 05/07/2005).
Em sede de legislação infraconstitucional, essa modalidade de aposentadoria está atualmente disciplinada pelos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.
Nessa espécie de benefício, o segurado adquire direito à aposentadoria após 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos de trabalho sujeito à exposição de agentes nocivos à saúde ou integridade física, conforme regras estabelecidas em lei, sendo que a Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, em seu artigo 15, determinou a vigência destas citadas normas até a sobrevinda da Lei Complementar prevista pelo artigo 201, § 1º, da Carta Magna.
De outra sorte, cumpre destacar que, guiado pelo princípio da proporcionalidade, o legislador infraconstitucional também regulou as hipóteses em que o trabalhador não dedica toda sua vida laboral ao exercício de atividades prejudiciais à saúde, mas tão-somente parte desta.
Nesses casos, permitiu a conversão do período de trabalho especial em comum, conforme dispõe o § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, com redação dada pela Lei nº. 9.032/95.
Todavia, em que pese a revogação do referido parágrafo pela MP 1.663-10, de 28 de maio de 1998, o artigo 70, § 2º, do Decreto nº 3.048/99 deixou claro que o tempo de serviço prestado sob condições especiais poderá ser convertido em tempo de atividade comum, independentemente da época trabalhada, mantendo-se, assim, a possibilidade de conversão originalmente prevista.
Ademais, o E. Tribunal Regional Federal desta 3ª Região já pacificou o entendimento de que “não prevalece mais qualquer tese de limitação temporal de conversão sejam em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/80, ou posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/98” (APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007011-92.2007.4.03.6183/SP).
Nesse sentido também decisões do C. Superior Tribunal de Justiça, que assentaram posicionamento da E. Corte no sentido de que permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois, a partir da última edição da MP nº 1.663, parcialmente convertida na Lei nº 9.711/98, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
Dessa feita, tendo o segurado trabalhado sob condições especiais durante apenas certo lapso temporal, inegavelmente poderá utilizá-lo para fins de conversão em tempo de serviço comum, somando-o aos demais períodos de trabalho comuns, para assim obter sua aposentadoria em menor lapso de tempo.
As exigências legais no tocante à comprovação do exercício de atividades especiais sofreram modificações relevantes com o passar dos anos, todavia, não se altera a conclusão de que a exposição do trabalhador a agentes nocivos à saúde ou integridade física deverá ser comprovada nos termos da legislação vigente na época em que o trabalho foi realizado (AC nº 2001.70.01.008632-3/PR).
No período anterior à edição do Decreto nº 2.172, de 05 de março de 1997, que regulamentou as disposições trazidas pela Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995, a comprovação das atividades exercidas sob condições especiais era realizada pela simples apresentação de “informações sobre atividades com exposição a agentes agressivos” (antigamente denominado SB-40 e, posteriormente, DSS 8030), que indicava a categoria profissional e os agentes agressivos em relação aos quais o trabalhador estava exposto.
É que a especialidade era atribuída em razão da categoria profissional, classificada nos Anexos dos Decretos nºs 53.831, de 25/03/64, e 83.080/79, de 24/01/79, sendo possível a comprovação do efetivo exercício destas atividades por quaisquer documentos, sendo que, a partir da Lei nº 9.032, de 29/04/95, regulamentada pelo Decreto 2.172/97, passou a ser necessária a comprovação do exercício da atividade prejudicial à saúde, através de formulários e laudos.
Desse modo, e uma vez enquadrando-se o trabalhador numa das atividades consideradas perigosas, penosas ou insalubres pelas normas aplicáveis à época (Decretos acima referidos), obtinha-se a declaração de tempo de serviço especial, independentemente de prova da efetiva exposição a agentes nocivos à saúde, com exceção dos agentes ruído e calor, que mesmo na vigência da legislação anterior impunham a sua demonstração por meio de laudo técnico.
O rol de atividades consideradas perigosas, penosas e insalubres não era exaustivo, pois se admitia a consideração do tempo especial relativamente ao exercício de outras atividades não previstas expressamente, desde que, nesses casos, fosse demonstrada a real exposição aos agentes agressivos.
Logo, pode-se concluir que, antes da edição da Lei nº 9.032/95, regulamentada pelo Decreto nº 2.172/97, havia uma presunção legal quanto às atividades consideradas especiais, aceitando-se, todavia, outras, mediante prova.
E tal regime normativo existiu desde a edição da Lei nº 3.807/60, que criou o benefício de aposentadoria especial, até 05/03/1997, quando foi revogada expressamente pelo Decreto nº 2.172/97.
Com a vigência da Lei nº 9.032, de 28 de abril de 1995, regulamentada pelo Decreto nº 2.172/97, passou-se a exigir efetiva comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos à saúde, para fins de concessão da aposentadoria especial, bem como para conversão de tempo especial em tempo de serviço comum.
Entretanto, em meu entendimento, tal exigência somente tornou-se exequível a partir da publicação do Decreto nº 2.172, de 05 de março de 1997, que veio regulamentar as novas disposições legais trazidas pela Lei nº 9.032/95, já que foi apenas nesse momento que os mencionados comandos legais foram operacionalizados.
Por essas razões, mostram-se absolutamente descabidos os critérios impostos pela Autarquia Previdenciária, por meio de seus atos normativos internos (OS 600), consubstanciados na exigência, para períodos de trabalho exercidos em data anterior a 05 de março de 1997, de apresentação de prova da efetiva exposição a agentes agressivos à saúde, para fins de consideração do tempo especial, por ferirem o princípio da legalidade.
Sendo assim, verifica-se que as atividades exercidas:
- até 05/03/97, são regidas pelos anexos do Decreto nº 53.831/64 e do Decreto nº 83.080/79 (artigo 292 do Decreto 611/92), cuja comprovação à exposição a gentes nocivos se dá por qualquer meio, exceto para ruído e calor, que nunca prescindiu de laudo técnico, sendo o rol de atividades exemplificativo;
- de 06/03/97 a 06/05/99, são regidas pelo anexo IV do Decreto 2.172/97, comprovadas através de formulário padrão (SB 40 ou DSS 8030) embasado em laudo técnico expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91), sendo o rol de atividades exemplificativo;
- A partir de 07/05/99, submetem-se ao anexo IV do decreto nº 3.048/99, comprovada a través de laudo técnico.
Nos termos do artigo 272, inciso II, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022, desde 01/01/2004, o documento que comprova a efetiva exposição a agente nocivo, nos termos exigidos pelo § 1º do artigo 58 da Lei de Benefícios, é o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário.
Nesse ponto, revejo meu posicionamento para acompanhar o entendimento atualmente majoritário na jurisprudência, no sentido de que o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário é suficiente para a caracterização do tempo especial, sendo dispensável que esteja assinado pelo responsável técnico habilitado ou acompanhado do respectivo LTCAT – Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho, desde que preenchidos os requisitos previstos na legislação previdenciária.
Conjugando o teor dos dispositivos mencionados (artigo 272, inciso II, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022; artigo 58, § 1º, da Lei de Benefícios), e tendo em vista o disposto no artigo 281, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022, é possível concluir que o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário, de fato, é suficiente para a caracterização do tempo especial, tendo em vista que se caracteriza como um documento completo, criado para substituir os formulários SB-40, DSS-8030 e sucessores, onde descrito todo o histórico laboral do trabalhador, trazendo em seu bojo todas as informações necessárias para o exame da possível exposição do segurado a agentes nocivos.
Destaco, ademais, que a própria Autarquia Previdenciária reconhece o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário como documento suficiente à comprovação do tempo especial. Nesse sentido é a previsão do artigo 281, § 4º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022, segundo o qual o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário dispensa a apresentação de laudo técnico ambiental para fins de comprovação de condição especial de trabalho, desde que todas as informações estejam adequadamente preenchidas e amparadas em laudo técnico.
Dessa forma, é preciso garantir o tratamento isonômico entre os segurados que pleiteiam seus benefícios previdenciários administrativamente e aqueles que são compelidos a buscar a via judicial. Se o INSS prevê em sua instrução normativa que o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário é suficiente para a caracterização de tempo especial, torna-se desproporcional exigir, na via judicial, que tal comprovação só poderá se dar por meio de laudo pericial, sob pena de adotar-se judicialmente critério mais restritivo.
Para ser válido, no entanto, o PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário deve conter informações básicas a respeito dos dados administrativos da empresa e do trabalhador, dos registros ambientais e dos responsáveis pelas informações (artigo 281, incisos I, II e III, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022). Além disso, deve estar assinado pelo representante legal da empresa ou seu preposto (artigo 281, § 1º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022), bem como indicar o nome e o CPF do responsável pela assinatura do documento (artigo 281, § 4º, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 128/2022).
Imperioso ressaltar, nesse particular, que a impugnação genérica do INSS quanto à não apresentação de procuração com outorga de poderes específicos ao subscritor do PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário ou declaração da empresa com autorização ao responsável pela assinatura deste documento não é suficiente para desconstituir o seu valor probante.
A propósito:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CONTAGEM DE TEMPO ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. PERÍODO ANTERIOR À EDIÇÃO DA LEI 9.032/95. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. PARADIGMAS QUE TRATAM DE PERÍODOS LABORADOS SOB A ÉGIDE DE OUTRA LEGISLAÇÃO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICO-JURÍDICA. PPP. AUSÊNCIA DE PROCURAÇÃO COM OUTORGA DE PODERES ESPECÍFICOS PARA O REPRESENTANTE LEGAL DA EMPRESA ASSINÁ-LO OU DECLARAÇÃO INFORMANDO QUE O SUBSCRITOR FOI DEVIDAMENTE AUTORIZADO. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA DO INSS COM BASE NO ART. 272, §12 DA IN 45/2020 DO INSS. APLICAÇÃO DA TESE APROVADA NO JULGAMENTO DO PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI 0507386-47.2018.4.05.8300, RELATORA JUÍZA FEDERAL POLYANA FALCÃO BRITO, 29/06/2020: "A IMPUGNAÇÃO GENÉRICA DO INSS QUANTO À NÃO APRESENTAÇÃO DE PROCURAÇÃO COM OUTORGA DE PODERES ESPECÍFICOS AO SUBSCRITOR DO PPP OU DECLARAÇÃO DA EMPRESA COM AUTORIZAÇÃO AO RESPONSÁVEL PELA ASSINATURA DESTE DOCUMENTO NÃO É SUFICIENTE, POR SI SÓ, PARA DESCONSTITUIR O SEU VALOR PROBANTE; PARA TANTO, É NECESSÁRIA A INDICAÇÃO DE ELEMENTOS DE PROVA QUE INDIQUEM A EXISTÊNCIA DE VÍCIOS NO PPP OU, QUANDO MENOS, QUE SEJAM APTOS A INCUTIR NO JULGADOR DÚVIDA OBJETIVA QUANTO À SUA IDONEIDADE." INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO NÃO CONHECIDO.
(TNU, PEDILEF 0500877-48.2019.4.05.8306, rel. Juíza Federal Carmen Elizangela Dias Moreira de Resende, j. 15/09/2023)
(Negritei).
Para se desconstituir o valor probante do PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário, é necessária a indicação de elementos de prova que sugiram a existência de vícios ou, quando menos, que sejam aptos a incutir no julgador dúvida objetiva quanto à sua idoneidade. Portanto, excepcionalmente, se idoneamente impugnado o conteúdo do PPP – Perfil Profissiográfico Previdenciário, pode-se exigir, também, a apresentação do LTCAT – Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho, que serviu de base à sua elaboração.
Nesse sentido:
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO (PPP). APRESENTAÇÃO SIMULTÂNEA DO RESPECTIVO LAUDO TÉCNICO DE CONDIÇÕES AMBIENTAIS DE TRABALHO (LTCAT). DESNECESSIDADE QUANDO AUSENTE IDÔNEA IMPUGNAÇÃO AO CONTEÚDO DO PPP.
1. Em regra, trazido aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), dispensável se faz, para o reconhecimento e contagem do tempo de serviço especial do segurado, a juntada do respectivo Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), na medida que o PPP já é elaborado com base nos dados existentes no LTCAT, ressalvando-se, entretanto, a necessidade da também apresentação desse laudo quando idoneamente impugnado o conteúdo do PPP.
2. No caso concreto, conforme destacado no escorreito acórdão da TNU, assim como no bem lançado pronunciamento do Parquet, não foi suscitada pelo órgão previdenciário nenhuma objeção específica às informações técnicas constantes do PPP anexado aos autos, não se podendo, por isso, recusar-lhe validade como meio de prova apto à comprovação da exposição do trabalhador ao agente nocivo "ruído".
3. Pedido de uniformização de jurisprudência improcedente.
(Pet. 10.262/RS, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 16.2.2017)
(Negritei).
Quanto à época em que confeccionado o documento, o E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região também já pacificou o entendimento de que “não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais à extemporaneidade de documento, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica” (APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0007011-92.2007.4.03.6183/SP).
Por derradeiro, no tocante ao aspecto dos níveis de ruído aplicáveis, acompanho a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, pelo que deve prevalecer:
a) o índice de 80 decibéis a quaisquer períodos de trabalho anteriores à vigência do Decreto nº 2.172, de 05/03/97 (Instrução Normativa nº 57/01, artigo 173, caput e inciso I);
b) no período de 06/03/97 a 18/11/2003, prevalece o nível de ruído de 90 decibéis, tendo em vista que aquela E. Corte pacificou o entendimento de que não há retroatividade do Decreto nº 4.882/03, que passou a prever nível de ruído de 85 decibéis;
c) a partir de 18/11/2003, data da vigência do Decreto nº 4.882/03, o nível de ruído exigido para aferição da especialidade é de 85 dB (STJ. Ag. Rg. no R. Esp. 139.9426 – 04/10/13).
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. APOSENTADORIA. RUÍDOS SUPERIORES A 80 DECIBÉIS ATÉ A EDIÇÃO DO DECRETO 2.171/97. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DA NORMA.
1. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação de que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.171/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis.
2. No entanto, concluiu o Tribunal de origem ser possível a conversão de tempo de serviço especial em comum, após o Decreto 2.172/1997, mesmo diante do nível de ruído inferior a 90 decibéis. Igualmente, levou em conta a aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, por ser mais benéfico, de modo a atentar para a atividade sujeita a ruídos superiores a 85 decibéis desde 6.3.1997, data do Decreto 2.172/1997.
3. Assim decidindo, contrariou o entendimento jurisprudencial do STJ de não ser possível atribuir retroatividade à norma sem expressa previsão legal, sob pena de ofensa ao disposto no art. 6º da LICC, notadamente porque o tempo de serviço é regido pela legislação vigente à época em que efetivamente prestado o labor. Precedentes do STJ.
4. Recurso Especial provido.
(RESP 201302641228 ESP - RECURSO ESPECIAL – 1397783; Relator(a) HERMAN BENJAMIN; Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA; Fonte: DJE DATA: 17/09/2013)
(Negritei).
Ainda quanto aos períodos cuja insalubridade for reconhecida, entendo que a simples informação de que o empregador fornecia equipamentos de proteção, individuais ou coletivos, não afasta a especialidade das atividades desempenhadas pela parte autora. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL - EPI. COMPROVAÇÃO DE NEUTRALIZAÇÃO DE INSALUBRIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ.
1. Este Tribunal Superior posiciona-se no sentido de que o simples fornecimento de EPI, ainda que tal equipamento seja efetivamente utilizado, não afasta, por si só, a caracterização da atividade especial. Também está assentado que, se a eficácia do Equipamento de Proteção Individual implicar revolvimento da matéria fático-probatória, como é o presente caso, o conhecimento do Recurso Especial esbarra no óbice da Súmula 7/STJ.
2. Agravo Regimental não provido.
(AGRESP 201400906282; AGRESP - AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – 1449590; Relator: HERMAN BENJAMIN; Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA; DJE DATA: 24/06/2014)
- Dos períodos especiais -
A parte autora pretende que sejam considerados como especiais os períodos de 01/11/2005 a 23/11/2007 (ASSOCIAÇÃO SAÚDE DA FAMÍLIA), 11/02/2008 a 21/05/2010 (SPDM – CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSOCIAL – CAPS ITAPEVA), 24/08/2015 a 26/07/2018 (ASSOCIAÇÃO EDUCACIONAL NOVE DE JULHO) e de 20/06/2016 a 09/05/2019 (SPDM – UNIDADE RECOMEÇO HELVETIA).
Imperioso destacar, inicialmente, que a partir da edição do Decreto n.º 2.172/97, em 05/03/1997, a legislação previdenciária deixou de prever o enquadramento de períodos de trabalho como especiais em face da profissão/função desempenhada pelo trabalhador, fazendo-se necessário, a partir de então, a comprovação de efetiva exposição a agentes agressivos à saúde, atestada em laudo técnico subscrito por Médico ou Engenheiro de Segurança do Trabalho.
Analisando a documentação trazida aos autos, verifico que apenas o período de 01/11/2005 a 23/11/2007 (ASSOCIAÇÃO SAÚDE DA FAMÍLIA) merece ter a especialidade reconhecida, vez que o autor esteve exposto, de modo habitual e permanente, a agentes nocivos biológicos, conforme atesta o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP (Id 337253147, p. 1/3) juntado, atividade enquadrada como especial segundo o Decreto 3.049, de 06 de maio de 1999, item 3.0.1.
Observo que referido PPP encontra-se devidamente assinado por representante legal da empresa, havendo, no documento, a indicação de seu cargo e NIT. Há, também, a indicação do responsável técnico legalmente habilitado pelos registros ambientais e resultados de monitoração biológica para todo o período de trabalho, nos termos da legislação previdenciária.
Assim, no caso específico dos autos, entendo que foram juntados documentos suficientes a comprovar o exercício de atividade em condições especiais no período sob comento.
Contudo, no que se refere aos períodos de 11/02/2008 a 21/05/2010 (SPDM – CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSOCIAL – CAPS ITAPEVA), 24/08/2015 a 26/07/2018 (ASSOCIAÇÃO EDUCACIONAL NOVE DE JULHO) e de 20/06/2016 a 09/05/2019 (SPDM – UNIDADE RECOMEÇO HELVETIA), não podem ser considerados especiais, ante a ausência de elementos probatórios aptos a demonstrar a efetiva exposição, de forma habitual e permanente, a agentes nocivos que pudessem ensejar o enquadramento pleiteado.
Tratando-se do período de 11/02/2008 a 21/05/2010 (SPDM – CENTRO DE ATENÇÃO PSICOSOCIAL – CAPS ITAPEVA), verifico que o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP juntado (Id 337253147, p. 5) não se presta ao fim almejado, tendo em vista que não contém as informações mínimas exigidas pela legislação que rege a matéria, especialmente quanto à indicação de responsáveis técnicos legalmente habilitados pelas informações de registros ambientais para o período apontado, vez que não há comprovação de ser Médico do Trabalho ou Engenheiro de Segurança do Trabalho, na forma da legislação regente.
Já o período de 24/08/2015 a 26/07/2018 (ASSOCIAÇÃO EDUCACIONAL NOVE DE JULHO) não pode ser considerado especial porque, embora o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP juntado no Id 337253148, p. 2 ateste que o autor trabalhava exposto a microorganismos e parasitas infectocontagiosos, a descrição de suas atividades, constante dos documentos citados, permite concluir que essa exposição, se existente, ocorria de modo intermitente ou ocasional, não habitual ou permanente.
Isso porque o autor desempenhava a função de preceptor de enfermagem, no setor de Preceptoria de Enfermagem, executando atividades essencialmente administrativas de ensino, quais sejam “auxilia os alunos na área de saúde acompanhando e ensinando determinado grupo de alunos, quando da sua inserção nos serviços de saúde, proporcionando-lhes o desenvolvimento e articulação dos conhecimentos teóricos-práticos dos processos de trabalho de enfermagem, visualizando-os como parte da dinâmica do trabalho coletivo em saúde” (Id 337253148, p. 2), não restando caracterizada, assim, a habitualidade da exposição, necessária ao enquadramento pretendido.
O período de 20/06/2016 a 09/05/2019 (SPDM – UNIDADE RECOMEÇO HELVETIA) também não deve ser reconhecido como especial. Apesar de o Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP acostado no Id 337253148, p. 3 atestar a exposição a fator de risco biológico, observa-se da descrição das atividades executadas pelo autor (“supervisionar os trabalhos de assistência a pacientes nos setores da Instituição, orientando tecnicamente sua equipe; preparando documentação de enfermagem. Realizando visita diária setores visando garantir o cumprimento das normas e procedimentos internos e assegurar a assistência de enfermagem com qualidade”) que eram essencialmente administrativas, desempenhadas no escopo da supervisão. Desse modo, também não resta caracterizada a habitualidade e permanência da exposição aos fatores de risco biológicos, o que inviabiliza o enquadramento almejado.
Caso fosse admitida a exposição aos fatores de risco, o enquadramento pretendido encontraria óbice no documento apresentado. Isso porque o PPP, além de conter dados divergentes entre os campos de lotação e atribuição (indica apenas o período de 10/2018 a 10/2019) e profissiografia (remete à data de 20/06/2016), não contém as informações mínimas exigidas pela legislação que rege a matéria, consistente nos dados necessários para identificação do representante legal da empresa (Id 337253148, p. 3), bem como a indicação dos dados dos responsáveis técnicos pelas informações de registros ambientais para todo o período almejado.
Destaco que apesar de haver a indicação de responsável pelos registros ambientais apenas para o período de 10/2018 a 10/2019, não há indicação se entre o período indicado e o remanescente (a partir de 20/06/2016), que a parte autora almeja o reconhecimento como especial houve ou não alteração de layout, de maquinário e de processos de trabalho no estabelecimento, tornando inviável o acolhimento da pretensão da parte autora.
A corroborar:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. RUÍDO. REQUISITOS CUMPRIDOS. BENEFÍCIO DEFERIDO.
(...)
11. Embora haja o entendimento segundo o qual o PPP mais antigo é digno de maior credibilidade, pois elaborado com maior proximidade à data do labor, no caso concreto, o PPP emitido em 29/01/2010 mostra-se incompleto, pois não há responsável pelos registros ambientais para o período em litígio e não há prova da manutenção do layout, do maquinário ou das condições de trabalho, o que permitiria o uso de medições posteriores.
12. O PPP em que não consta responsável técnico pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica revela-se incapaz de provar as condições de trabalho às quais o segurado está submetido, de modo que não é possível reconhecer os períodos pleiteados como tempo especial.
(...)
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5044330-79.2022.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal JEAN MARCOS FERREIRA, julgado em 30/09/2024, DJEN DATA: 02/10/2024)
Dessa forma, tendo em vista que o ônus da prova incumbe ao autor quanto aos fatos constitutivos do seu direito, nos termos do artigo 373, inciso I, do Código de Processo Civil, e não logrando ele demonstrar documentalmente os fatos constitutivos do direito alegado, não procede o pedido de reconhecimento da especialidade formulado na inicial.
- Conclusão -
Portanto, o pleito merece ser parcialmente provido, apenas para que seja reconhecido o período especial de 01/11/2005 a 23/11/2007 (ASSOCIAÇÃO SAÚDE DA FAMÍLIA), para fins de averbação previdenciária e revisão da RMI do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição do autor, nos termos da tabela anexa à presente sentença.
A revisão será devida desde a citação da Autarquia-ré em 20/10/2024, considerando que o documento que ensejou o reconhecimento da especialidade, embora tenha sido apresentado no requerimento administrativo (Id 309981499, p. 13/15), estava ilegível (referenciado na decisão administrativa do Id 309981499, p. 79) e só foi juntado cópia legível no Id 337253147, após determinação judicial (Id 335933391).
- Dispositivo -
Por tudo quanto exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente ação, julgando extinto o feito com o exame de seu mérito, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, pelo que reconheço e homologo o período especial de 01/11/2005 a 23/11/2007 (ASSOCIAÇÃO SAÚDE DA FAMÍLIA), e condeno o Instituto-réu a convertê-lo em tempo de serviço comum, procedendo à pertinente averbação para fins de revisão da renda mensal inicial – RMI do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição do autor, NB 42/195.553.094-4, conforme tabela anexa a esta sentença, desde a citação do INSS em 20/10/2024, nos termos da fundamentação acima, devendo incidir juros e correção monetária sobre as prestações vencidas, desde quando devidas, afastada a prescrição quinquenal, compensando-se os valores já recebidos, na forma da legislação aplicável à liquidação de sentença previdenciária, observando-se, para tanto, quanto à incidência de correção e juros de mora, o Manual de Cálculos da Justiça Federal aprovado pela Resolução nº 658, de 18.08.2020, alterada pelo Resolução nº 784, de 08.08.2022, ambas do Presidente do Conselho da Justiça Federal, ainda, os juros de mora deverão incidir de forma englobada em relação às prestações anteriores à citação e, após, deverão ser calculados mês a mês, de forma decrescente.
Sem custas. Diante da mínima sucumbência do réu (art. 86, parágrafo único, do CPC), fixo em seu favor os honorários advocatícios em 10% do valor da causa (art. 85, § 3º, inciso I, do CPC), cuja execução fica suspensa, nos termos do art. 98, §§ 2º e 3º do CPC.
Deixo de determinar o reexame necessário, nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do CPC, vez que não se trata de causa com valor superior ao previsto no referido artigo.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
São Paulo, data da assinatura eletrônica.
 | Assinado eletronicamente por: TATIANA RUAS NOGUEIRA 11/03/2025 18:58:37 https://pje1g.trf3.jus.br:443/pje/Processo/ConsultaDocumento/listView.seam ID do documento: 356632879 |
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