CORREÇÃO DO PASEP: SENTENÇA FAVORÁVEL DO TJRN, EM QUE CONDENOU O BANCO DO BRASIL A PAGAR MAIS DE R$ 23 MIL DE INDENIZAÇÃO, VEJA O CASO

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE / 2ª Vara Cível Não Especializada da Comarca de Mossoró Alameda das Carnaubeiras, 355, 3º Andar, Presidente Costa e Silva, MOSSORÓ – RN

 

Processo:  0802027-98.2020.8.20.5106

 

S E N T E N Ç A

 

EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. COBRANÇA DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATUALIZAÇÃO DE VALORES DEPOSITADOS EM CONTA DO PASEP. INAPLICABILIDADE DO CDC. ÍNDICES DE CORREÇÃO DISPOSTOS NA LEI COMPLEMENTAR Nº 26/75. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO QUE REMANESCEM VALORES A RECEBER DO SALDO INICIAL, DE CZ$ 143.754,00 (CENTO E QUARENTA E TRÊS MIL SETECENTOS E CINQUENTA E QUATRO CRUZEIROS). MICROFILMAGENS DO AUTOR QUE CONSTAM VALORES ANTERIORES AO ANO DE 1983, DIVERSAMENTE DAQUELES APRESENTADOS PELO DEMANDADO. DEVER DO RÉU DE RESTITUIR OS VALORES NÃO CORRIGIDOS. DANOS MORAIS NÃO VERIFICADOS. PROCEDÊNCIA PARCIAL DOS PEDIDOS. EXTINÇÃO DO PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

 

1. Relatório:

ANTONIO LEANDRO DE SOUZA, qualificado à exordial, por intermédio de procurador judicial, promoveu a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS, em desfavor do BANCO DO BRASIL S.A., igualmente qualificado, aduzindo, em suma, que:

 

01– Ingressou no serviço público no ano de 1981, tendo laborado no período de 02/01/1981 até 17/03/2016;

 

02 – Em função da ocupação exercida no serviço público, acumulou em sua conta individual junto ao Banco do Brasil, até a data da promulgação da constituição vigente, o montante correspondente a Cz$ 143.754,00 (cento e quarenta e três mil, setecentos e cinquenta e quatro cruzados);

 

03 – Ao sacar as suas cotas do PASEP, deparou-se com o ínfimo valor de R$ 1.922,56 (mil novecentos e vinte e dois reais e cinquenta e seis centavos);

 

04 – Ao indagar ao funcionário do réu sobre as cotas de participação que foram depositadas em sua conta individual desde a sua inscrição, obteve a informação que os registros, referentes ao seu PASEP, constantes do banco de dados daquela instituição, reportavam-se apenas ao período de 1999 até aquela ocasião (23/03/2016), não havendo nada referente ao período reclamado;

 

05 – Voltou ao Banco do Brasil e requereu a microfilmagem do Banco Central, referente a todo período de sua participação no PASEP, ou seja, no período de 1981 até 2016;

 

06 – Constatou, conforme suas expectativas, que foram realizados depósitos anuais em sua conta individual do PASEP, no período de 1981 a 1988 (último ano em que houve depósitos de cotas), valores estes que, acrescidos de juros de mora e correção monetária por um período tão longo, totalizariam um montante bem superior ao que o réu entende como devido.

 

Ao final, afora a gratuidade judiciária, o autor requereu a procedência do pedido, a fim de ser o réu condenado ao pagamento de R$ 227.936,95 (duzentos e vinte e sete mil, novecentos e trinta e seis reais e noventa e cinco centavos a título de danos materiais em razão dos valores subtraídos e/o não repassados para a conta individual do autor, face à inobservância dos rendimentos legais, além de postular indenização por danos morais, estimando-os em R$ 10.000,00 (dez mil reais).

 

Despachando, deferi o pedido de gratuidade judiciária e determinei a citação da parte demandada, com as cautelas legais.

 

Contestando, a instituição financeira ré suscitou as preliminares de impugnação ao valor atribuído à causa, além de se insurgir contra a concessão do benefício da gratuidade judiciária, em prol do autor, e invocou a sua ilegitimidade passiva ad causam, apresentando-se como mero depositário das quantias do PASEP, donde requereu a inclusão da União Federal no polo passivo da lide, o que acarretaria na competência exclusiva da Justiça Federal, para processar e julgar o feito, ultimando a parte ré também pelo reconhecimento da prejudicial de mérito da prescrição.

No mérito, defendeu que a atualização da conta do PASEP do autor obedeceu aos índices de juros e correção monetária previstos na legislação de regência, remetendo-se, ainda, aos saques anuais por meio de crédito em folha de pagamento, inexistindo, portanto, ato ilícito ou dano moral passível de indenização.

 

Impugnação à contestação.

 

Despachando, o Juiz processante determinou a remessa dos autos para Contadoria do Foro, a fim de se verificar, com base nos microfilmes e extratos anexados aos autos, se a conta do PASEP do autor foi atualizada de acordo com os índices legais acima apontados, o que restou atendido no ID de nº 48843835 - Pág. 290.

 

No ID de nº 59449486, facultei às partes o prazo comum de 15 (quinze) dias, para que apontassem, de maneira clara, objetiva e sucinta, as questões de fato e de direito que entendiam pertinentes ao julgamento da lide.

 

Respostas pela parte autora e demandado, nos ID(s) de nºs 60486696 e 60562591.

 

Decidindo (Id de nº 60588043), rejeitei as preliminares e a prejudicial de mérito, e fixei os pontos controvertidos supra (item II), para assinalar o prazo comum de 20 (vinte) dias, com vista à promoção pelas partes das provas suficientes para o deslinde da causa, além de ter invertido o ônus da prova, em favor do autor.

 

Manifestações do autor (ID de nº 61036966) e do réu (ID de nº 61721584).

 

No despacho de ID de nº 63387795, determinei a remessa dos autos ao NUPEJ do TJRN, com vista à indicação de perito, na área contábil, para realização de prova pericial técnica, fixando os honorários em R$ 1.110,00 (mil e cento e dez reais).

 

Laudo pericial (Id de nº 65243004), sobre o qual se pronunciaram o autor (ID de nº 66208857) e o réu (ID de nº 65758081).

 

Dessa forma, vieram-me os autos conclusos.

 

2- Fundamentação:

 

Ao caso, inaplicável as regras do Código de Defesa do Consumidor, eis que o PIS-PASEP não está sujeito a regras consumeristas, motivo pelo qual não cabe a aplicação da medida inversão do ônus da prova.

 

In casu, tratando-se a presente lide da discussão acerca dos rendimentos encontrados em valores de conta do PASEP, observo que a regulamentação conferida à matéria encontra previsão na Lei complementar nº 26/75:

 

Art. 3º - Após a unificação determinada no art. 1º, as contas individuais dos participantes passarão a ser creditadas:

 a) pela correção monetária anual do saldo credor, obedecidos os índices aplicáveis às Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN);

 b) pelos juros mínimos de 3% (três por cento) calculados anualmente sobre o saldo credor corrigido;

 c) pelo resultado líquido adicional das operações realizadas com recursos do PIS-PASEP, deduzidas as despesas administrativas e as provisões de reserva cuja constituição seja indispensável.

 

No curso do feito, foi produzida prova pericial técnica, concluindo o expert o seguinte, verbis

 

“Ao verificar no processo consta que o Autor iniciou no programa PASEP, com um valor de Cz$ 143.754,00 (Cento e quarenta e três mil setecentos e cinquenta e quatro cruzeiros) conforme fls 11 do processo.

Já o banco Réu, perante o extrato da conta PASEP do Autor, alega que o mesmo é participante do programa PASEP, porém com um montante inicial de Cz$ 46.832,00 (Quarenta e seis mil oitocentos e trinta e dois cruzeiros) conforme fls 259 do processo.

As conversões das moedas do período analisado foram feitas de forma adequada conforme descreve a Lei.

As taxas de juros do programa PASEP tiveram diversas formas de serem calculadas conforme as legislações, porém, em sua grande maioria, (a remuneração rendimentos ou as valorizações das cotas), foram superiores as da legislação vigente, portanto não houve má gestão das cotas do alega o Autor.

Do saldo em questão: Como existe uma divergência entre os saldos iniciais das cotas do programa PASEP.

1º situação: do autor, caso seja considerado o seu saldo como inicial, Cz$ 143.754,00 (Cento e quarenta e três mil setecentos e cinquenta e quatro cruzeiros) conforme fls 11.

Sim, existe um saldo a ser pago de no valor de R$ 18.710,31 que atualizados até a data atual: (janeiro/2021) chegaríamos a um montante de R$ 23.712,47 (vinte e três mil setecentos e doze reais e quarenta e sete centavos);

2ª Situação:  caso seja levado em conta o Saldo inicial do banco réu Cz$ 46.832,00 (Quarenta e seis mil oitocentos e trinta e dois cruzeiros) conforme fls 259 – Não existe saldo a pagar” (ID de nº 65243004).

 

Acerca do saldo inicial, tenho que de fato há divergência, eis que o autor indica como saldo inicial a quantia correspondente a Cz$ 143.754,00 (Cento e quarenta e três mil setecentos e cinquenta e quatro cruzeiros), enquanto o réu aponta a importância de Cz$ 46.832,00 (Quarenta e seis mil oitocentos e trinta e dois cruzeiros).

 

Analisando detidamente os documentos colacionados à exordial (ID de nº 53097887) e aqueles trazidos pelo réu (ID de nº 55257790), observo que, nestes últimos, consta a informação de que, apenas a partir do ano de 1983, o autor possuía saldo do FGTS, ao passo que nas microfilmagens acostadas pelo autor, com a exordial, consta a existência de valores depositados desde o ano de 1981.

 

Por conseguinte, prevalecendo o entendimento de que o valor inicial depositado correspondia a Cz$ 143.754,00 (Cento e quarenta e três mil setecentos e cinquenta e quatro cruzeiros), o montante devido equivale a R$ 23.712,47 (vinte e três mil setecentos e doze reais e quarenta e sete centavos), valor esse atualizado até o mês de janeiro de 2021.

 

No mais, tendo em vista que já existe depositada a quantia de R$ 1.922,56 (mil novecentos e vinte e dois reais e cinquenta e seis centavos), em conta do autor, referente ao FGTS, remanesce a ser pago o importe de R$ 21.789,91 (vinte e um mil e setecentos e oitenta e nove reais e noventa e um centavos), atualizado até janeiro de 2021, ao qual se agregam juros remuneratórios, com base na TJLP e no RLA-Resultado Líquido Adicional, se houver, conforme determina o art. 12 da Lei nº 9.365/96, e a Resolução do Conselho Monetário Nacional de nº 2.131/94.

 

De outro lado, analisando a pretensão indenizatória por danos morais, não me convenço de que a conduta do demandado tenha gerado lesão imaterial ao autor, embora a falha na prestação de serviços tenha sido indesejável e desagradável, configura mero descumprimento contratual, não ofendendo a direitos de personalidade do postulante.

 

O eminente Desembargador Sérgio Cavalieri, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, muito bem realçou que "só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são tão intensas e duradouras a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais acontecimentos." (Programa de Responsabilidade Civil. Malheiros Editores, 2ª edição, p. 78).

 

3. Dispositivo:

 

EX POSITIS, extingo o processo com resolução do mérito, nos moldes do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGANDO PARCIALMENTE PROCEDENTES os por ANTONIO LEANDRO DE SOUZA pedidos formulados na inicial em frente ao  BANCO  DO BRASIL S.A, para condenar o réu a pagar ao autor a importância de R$ 21.789,91 (vinte e um mil e setecentos e oitenta e nove reais e noventa e um centavos), atualizada até o mês de janeiro de 2021, acrescendo-se juros remuneratórios, com base na TJLP, e no RLA-Resultado Líquido Adicional, se houver.

 

Em atenção ao princípio da sucumbência (art. 89, CPC), condeno as partes ao pagamento pro rata das despesas processuais, nestas compreendidas as custas e honorários periciais (R$ 1.100,00), e ao pagamento de honorários advocatícios dos patronos da parte adversa, no percentual de 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, em relação à verba honorária dos patronos do autor, e, no mesmo patamar, sobre o pleito indenizatório inacolhido, em relação aos honorários advocatícios dos patronos do demandado, cuja exigibilidade fica suspensa quanto ao autor, na forma do art. 98, §3º do CPC.

 

CARLA VIRGINIA PORTELA DA SILVA ARAUJO

Juiz(a) de Direito

 

 

 

Com alteração simples para facilitar a compreensão do público a que se destina o conteúdo

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