Hoje vamos falar do requisito econômico para concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC). Você verão adiante que o assunto o STJ já posicionou-se nos seguintes termos: “a delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do requerente”.
Para ter direito aos benefícios previdenciários,
você deve inscrever-se e contribuir com a previdência social.
Antes de irmos para o tema indicado no título do singelo
artigo, precisamos rememorara que a “Previdência Social é um
seguro que garante a renda do contribuinte e de sua família, em casos de doença,
acidente, gravidez, prisão, morte
e velhice”.
Igualmente, rememoremos que a Previdência
Social, “oferece vários benefícios, como aposentadoria,
salário-maternidade, pensão por morte, auxílio-doença,
auxílio-reclusão e auxílio-acidente (...)”.
Mas para se ter direito a esses benefícios, o
cidadão deve se inscrever no Regime Geral da Previdência Social (RGPS) e contribuir
mensalmente.
Ocorre que, poder pagar todos os meses a
previdência social, infelizmente não é privilégio para todos no
Brasil. E com isto, grande quantidade de brasileiros, acabam ficado sem
essa proteção imprescindível para a sua subsistência. Notadamente quando mais
precisa, que é na velhice ou no caso da pessoa com deficiência.
Diante dessa situação, foi necessário, então,
criar algo que protegesse os economicamente mais frágeis, aos quais o
Estado tem o dever de prestar assistência.
Assim, chegamos ao Benefício de Prestação
Continuada (BPC), que garante renda no valor de um salário mínimo mensal
para pessoas com deficiência de qualquer idade ou para idosos com
idade de 65 anos ou mais de idade, e que comprovem não possuir meios de
prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (sobre
critérios, procedimentos e instrumentos para a avaliação social e médica da
pessoa com deficiência para acesso ao Benefício de Prestação Continuada ler Portaria
Conjunta INSS/MDS n.º 2, de 30.3.2015)
Para a concessão deste benefício, é exigido que a
renda familiar mensal seja de até ¼ de salário mínimo por pessoa.
A sua previsão legal, encontra-se no art. 203, V,
da Constituição Federal, com o disciplinamento nos arts. 20 e 21 da LOAS, e
regulamentado pelo Decreto n. 6.214, de 26.09.2007, com a redação dada pelo
Decreto n. 7.617/2011.
É oportuno, ressaltar que esse benefício é de caráter
personalíssimo, logo, não tem natureza previdenciária, e, por
isso, não gera direito à pensão por morte (art. 23 do Dec. n.
6.214/2007).
Igualmente, com base nos mesmos argumentos acima, não
dá direito a abono anual (art. 22 do Dec. n. 6.214/2007).
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Ocorre que a exigência de que a renda per capita
seja inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo, acabe por vezes, sendo
um obstáculo para que pessoas economicamente frágeis tenham acesse a
esse benefício. E é sobre isto que trataremos no próximo parágrafo.
Antes cabe esclarecer que de acordo com o Decreto
n.º 7.617, de 2011, a renda mensal bruta corresponde a: “soma dos
rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos membros da família composta por
salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios de previdência
pública ou privada, seguro-desemprego, comissões, pró-labore, outros
rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou
autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e
Benefício de Prestação Continuada”.
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR
OUTROS MEIOS DE PROVA
Superada essa fase, caso o pedido de Benefício de
Prestação Continuada (BPC), seja indeferido (negado) sob alegação do não
preenchimento do requisito econômico, deve-se argumentar que segundo
orientação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) “a delimitação do valor da
renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da
condição de miserabilidade do requerente”.
Nessa linha, o STJ ao julgar Recurso Especial,
cujo tema foio requisito econômico para concessão do Benefício
de Prestação Continuada (BPC), nos termos do art.
1.036 do Código de Processo Civil/2015 (art. 543-C do CPC/1973),
assim se pronunciou:
BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE
DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS
DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A
1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO.
– No
âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz
(art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo
qual essa delimitação do valor da renda familiar“per
capita” não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado.
– Não se
pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob
pena de cercear o seu direito de julgar. (REsp n.º 1.112.557/MG, 3.a Seção,
Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 20.11.2009). Grifei
No Supremo Tribunal Federal (STF) o caso foi
apreciado nos autos da RECLAMAÇÃO (RCL 4374), a qual encontra-se assim
ementada:
Benefício
assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da
Constituição.
A Lei de
Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da
Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de
um salário mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos
que comprovassem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família.
2. Art.
20, § 3º da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo
Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232.
Dispõe o
art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-se incapaz de prover a
manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda
mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”.
O
requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade
contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente
miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício
assistencial previsto constitucionalmente.
Ao
apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal
Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS.
3. Reclamação
como instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle de
constitucionalidade abstrato.
Preliminarmente,
arguido o prejuízo da reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos
extraordinários 580.963 e 567.985, o Tribunal, por maioria de votos, conheceu
da reclamação.
O STF, no
exercício da competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e
material de qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar a
inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como fundamento da
decisão ou do ato que é impugnado na reclamação. Isso decorre da própria
competência atribuída ao STF para exercer o denominado controle difuso da
constitucionalidade das leis e dos atos normativos.
A
oportunidade de reapreciação das decisões tomadas em sede de controle abstrato
de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no
âmbito das reclamações. É no juízo hermenêutico típico da reclamação – no “balançar
de olhos” entre objeto e parâmetro da reclamação – que surgirá com maior
nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle de
constitucionalidade.
Com base
na alegação de afronta a determinada decisão do STF, o Tribunal poderá
reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E,
inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro
da reclamação, se entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal
decisão não se coaduna mais com a interpretação atual da Constituição
4.
Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e
Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993.
A decisão
do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido
pela LOAS.
Como a
lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério
objetivo e único estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade
social das famílias com entes idosos ou deficientes.
Paralelamente,
foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão
de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o
Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que
autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que
instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas.
O Supremo
Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores
posicionamentos acerca da intransponibilidade dos critérios objetivos.
Verificou-se
a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias
mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas
modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de
concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
5.
Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art.
20, § 3º, da Lei 8.742/1993.
Ainda no STF, recomendo a leitura do Recurso
Extraordinário (RE 580.963/PR) da relatoria do Min. Gilmar Mendes, julgado em
18.4.2013, em que se decidiu pela inconstitucional do parágrafo único do art.
34 do Estatuto do Idoso, segundo os ministros, por violar o princípio da
isonomia, ao abrir exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais
de idoso, mas não permitir a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente
ou de qualquer outro previdenciário.
Por fim, é crível concluir que a comprovação da miserabilidade
pode perfeitamente ser analisada em cada caso concreto. Portanto, ao ter
o pedido negado, deve-se buscar aferir a condição de hipossuficiência econômica
do idoso ou da pessoa com deficiência por outros meios que não
apenas a comprovação da renda familiar mensal.
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