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VALTER DOS SANTOS
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ERRO
EM CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO DO INSS GERA DANO MORAL PREVIDENCIÁRIO / O
cancelamento indevido de um benefício pago pelo INSS sem o devido cuidado é
suficiente para causar dano moral previdenciário. Com esse entendimento, o juiz
Narciso Leandro Xavier Baez, da 2ª Vara Federal de Chapecó (SC), condenou a
autarquia a pagar R$ 5 mil a uma pessoa aposentada por invalidez. VEJA A DECISÃO A SEGUIR:
JUSTIÇA FEDERAL
Seção Judiciária de
Santa Catarina
2ª Vara Federal de Chapecó
Rua Florianópolis, 901, D - Bairro: Jardim Itália - CEP:
89814-200 - Fone: (49)3361-1300 - www.jfsc.jus.br - Email: sccha02@jfsc.jus.br
PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL Nº 5010686-70.2022.4.04.7202/SC
AUTOR: CELSO VARGAS
ADVOGADO(A): CARLOS
CESAR MACEDO REBLIN (OAB SC017392)
RÉU:
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
SENTENÇA
I -
RELATÓRIO
Dispensado o relatório
(art. 38 da Lei nº 9.099-1995).
II –
FUNDAMENTAÇÃO
Trata-se de ação em que o autor pretende a
condenação da ré ao pagamento de danos morais derivados de alegada má prestação de serviço no
valor de R$ 15.000,00, sob o argumento de que sofreu abalo ao ter seu benefício
cancelado indevidamente.
Responsabilidade civil do Estado
A teoria da responsabilidade objetiva foi acolhida
pelo ordenamento jurídico brasileiro, aplicando-se, sobretudo, às pessoas
jurídicas de direito público e às de direito privado prestadoras de serviço
público, que respondem objetivamente pelos danos causados por seus agentes,
assegurado o direito de regresso, a teor do que preceitua o § 6º do artigo 37
da Constituição Federal:
"As pessoas jurídicas de direito público e as
de direito privado, prestadoras de serviços públicos, responderão pelos danos
que seus agentes, nessa qualidade causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
Portanto, a responsabilidade civil das pessoas
jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviço
público tem como pressupostos: (a) a existência de uma ação comissiva ou
omissiva qualificada juridicamente; (b) a ocorrência de um dano patrimonial
ou moral causado à vítima por ato comissivo ou omissivo do agente ou de
terceiro por quem o imputado responde; e (c) o nexo de causalidade entre
o dano e ação.
A responsabilidade só será afastada quando não
houver causalidade entre a conduta do agente e o dano ocorrido, ou seja, o fato
tenha decorrido de culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, ou tenha derivado
de caso fortuito ou força maior.
Do Dano Moral
Enquanto lesão a um interesse não patrimonial, o
dano moral já há muito tempo foi reconhecido pela doutrina e jurisprudência,
inclusive consagrado pela CF/88 (art. 5º, V e X) e tendo também, com a vigência
do novo CC, previsão em norma infraconstitucional (art. 186).
A indenização por danos morais é uma compensação
de prejuízos psíquicos, como desgostos, vexames, dores físicas, luto, perda de
reputação ou prestígio, insuscetíveis de avaliação pecuniária stricto sensu,
porque não atingem o patrimônio material.
Porém, não é qualquer incômodo, aborrecimento ou
tristeza que dá ensejo à reparação por danos morais: o dano moral indenizável é
aquele que afeta os direitos da personalidade.
São aqueles direitos que a pessoa tem para
defender o que é seu, como a vida, a integridade, a liberdade, a sociabilidade,
a honra, a privacidade, a autoria, a imagem e outros, todos com fundamento na
dignidade da pessoa humana.
Cabe, em suma, aferir caso a caso a medida em que
o ato em cotejo tenha agredido psicologicamente a suposta vítima, para que se
possa ter efetivamente configurado - ou não - o dano moral.
Do Caso Concreto
No caso dos autos restou suficientemente
demonstrado que a suspensão do benefício previdenciário do autor ocorreu por
equívoco do INSS. Na perícia realizada junto ao feito judicial o perito referiu
que o autor possui incapacidade multiprofissional e que não possui condições de
reabilitação profissional em razão do baixo nível de escolaridade e da idade
(evento 1- OUT8).
O benefício
de aposentadoria por invalidez era pago desde o ano de 2004, ou seja, há cerca
de 14 anos quando ocorreu a revisão e cancelamento.
Verifica-se na descrição d perícia que o médico
ressaltou que o autor tinha dificuldades, mas que não haviam exames ou
registros médicos recentes e que o exame físico estava prejudicado.
O INSS não pleiteou que autor atualizasse seus
exames antes de concluir pela capacidade laborativa, nem tampouco levou em
consideração as condições pessoais do autor e o longo tempo de benefício
alimentar, cujo cancelamento traria prejuízos incontáveis ao autor.
Desta
forma, restou comprovada a falha do serviço prestado pela autarquia.
E o INSS deixou de comprovar que a falha no
serviço tenha se dado por culpa exclusiva do autor, de terceiros ou de caso
fortuito ou força maior.
Acerca da responsabilidade do INSS e de ser devido
o pagamento de indenização por
danos morais quando da cessação indevida de benefício
previdenciário, já se manifestou o STJ :
PREVIDENCIÁRIO.
RESPONSABILIDADE CIVIL. CESSAÇÃO INDEVIDA DE AUXÍLIO-ACIDENTE POR ERRO
NA IDENTIFICAÇÃO DO ÓBITO DE HOMÔNIMO DO BENEFICIÁRIO. DANO MORAL IN RE IPSA.
DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. NÃO OCORRÊNCIA. SÚMULA 83/STJ. 1. A irresignação
do INSS se restringe, basicamente, ao entendimento perfilhado pelo acórdão de
origem de que a cessação indevida do benefício previdenciário implicaria dano
moral in re ipsa, apontando divergência jurisprudencial em relação a
precedentes do Tribunal Regional Federal da 4ª Região em que se exigira a prova
do dano moral para autorizar sua indenização. 2. Não obstante o posicionamento
dissonante entre os arestos colacionados pelo recorrente, o Superior
Tribunal de Justiça já teve oportunidade de dispensar a prova do sofrimento
psicológico em inúmeros situações, a exemplo da inscrição indevida em cadastro
de inadimplentes (AgRg no AREsp 331.184/RS, Rel. Ministro João Otávio de
Noronha, Terceira Turma, DJe 5/5/2014), da suspensão indevida do
fornecimento de água por débitos pretéritos (AgRg no AREsp 484.166/RS, Rel.
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe 8/5/2014), do protesto
indevido de título (AgRg no AREsp 444.194/SC, Rel. Ministro Sidnei Beneti,
Terceira Turma, DJe 16/5/2014), da recusa indevida ou injustificada, pela
operadora de plano de saúde, em autorizar a cobertura financeira de tratamento
médico a que esteja legal ou contratualmente obrigada (AgRg no AREsp
144.028/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 14/4/2014), entre
outros. 3. No caso concreto, o acórdão de origem traz situação em que o INSS
suspendeu o auxílio-doença em virtude da equivocada identificação do óbito de
homônimo do autor. Nessas circunstâncias, é presumível o sofrimento e a
angústia de quem, de inopino, é privado da sua fonte de subsistência mensal, e,
no caso, o benefício previdenciário decorre de auxílio-acidente. 4. Agravo
Regimental não provido. (AGARESP 201400562175, HERMAN BENJAMIN, STJ - SEGUNDA
TURMA, DJE DATA:14/08/2014 ..DTPB:.) (grifo nosso).
Neste sentido também é o entendimento do Tribunal
Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RESTABELECIMENTO. DANO MORAL. REPARAÇÃO. POSSIBILIDADE.
1. Nas ações de natureza previdenciária, a condenação em danos morais é
excepcional, não sendo cabível quando se trata de mero indeferimento de
benefício na via administrativa, quando o INSS atua no exercício de suas
atribuições, interpretando a legislação tomando decisões posteriormente
sujeitas ao controle jurisdicional. 2. Quando nesta atuação, porém, fica
evidenciado que a autarquia agiu de forma temerária, ao cancelar benefício
assistencial vigente há anos, sem elementos minimamente consistentes para isso,
causando prejuízos à subsistência daquele que já dependia do benefício,
impõe-se reconhecer o direito aos danos morais, frente ao especial sofrimento
causado. 3. Para caracterizar a ocorrência do dano moral não é necessário
que haja o propósito deliberado de cancelar indevidamente o benefício. Considerando-se
os graves efeitos da eventual supressão da condição econômica de subsistência
do cidadão, exige-se do INSS cuidado redobrado ao pretender revisar atos de
concessão de benefícios, especialmente de pessoas de baixa renda, devendo
lastrear-se em profunda investigação dos elementos determinantes, não sendo
suficiente o mero reexame da prova considerada suficiente para a anterior
implantação. 4. O arbitramento do dano moral deve buscar reparar o sofrimento
causado, sem, contudo, significar enriquecimento excessivo, e, ao mesmo tempo,
representar um alerta pedagógico ao violador do direito, buscando alcançar
efeitos compensatório e dissuasório. 5. Considerando a evidência e a total
falta de justificativa para o erro do INSS, bem como o sofrimento causado ao
beneficiário, o valor da indenização vai fixado no correspondente ao total das
parcelas vencidas desde a indevida suspensão do benefício até a data em que
cumprida a antecipação da tutela deferida em juízo. (TRF4, AC
5000556-55.2018.4.04.7139, SEXTA TURMA, Relatora para Acórdão TAÍS SCHILLING
FERRAZ, juntado aos autos em 12/11/2019) (grifo nosso).
ADMINISTRATIVO. CIVIL.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. ATRASO
NA
IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESCUMPRIMENTO DE COISA JULGADA PELO
INSS - RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. DANO MORAL - CABÍVEL. A
responsabilidade objetiva independe da comprovação de culpa ou dolo, ou seja,
basta estar configurada a existência do dano, da ação e do nexo de causalidade
entre ambos (art. 37, §6º da CF/88). O simples indeferimento de benefício
previdenciário, ou mesmo o cancelamento de benefício por parte do INSS, não se
prestam para caracterizar dano moral. Somente se cogita de dano moral quando
demonstrada violação a direito subjetivo e efetivo abalo moral, em razão de
procedimento flagrantemente abusivo ou equivocado por parte da Administração,
já que a tomada de decisões é inerente à sua atuação. Inexistindo
justificativa do INSS para demora em cumprir a ordem judicial transitada em
julgado que determinou a implantação do benefício de amparo assistencial, fica
demonstrado que o ato estatal foi o causador da restrição de recebimento de
verba alimentar por parte da autora, o que transpõe meros aborrecimentos e
dissabores do cotidiano. Comprovada a responsabilidade do INSS pelos danos
decorrentes da não implantação do benefício previdenciário, cabível a
indenização por danos morais. Na quantificação do dano moral devem ser
sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas
das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a
eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A
indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular
a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ainda evitar o
enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano. (grifou-se) (TRF4, AC
5002879-87.2013.404.7210, Quarta Turma, Relator p/ Acórdão Luís Alberto
D'azevedo Aurvalle, juntado aos autos em 26/05/2015) (grifei).
Verificados, assim, o nexo causal e a responsabilidade do INSS quanto ao
ocorrido, sendo desnecessária qualquer avaliação subjetiva quanto à conduta da
autarquia, vez que se trata de responsabilidade objetiva, assentada sobre o
art. 37, §6º, da Constituição Federal.
A
ocorrência do dano moral evidencia-se pela própria natureza da verba subtraída.
Os benefícios previdenciários consubstanciam-se verba alimentar, destinada,
portanto, à própria subsistência da beneficiada. Deparar-se com a ausência de
seus valores em data que habitualmente são depositados é suficiente para que se
vislumbrem aflições à pessoa.
Ademais, o
autor teve seu nome inscrito em cadastros de inadimplência e se viu exposto a
grandes constrangimentos.
Do Valor do Dano Moral
Não há parâmetros legais definidos para a fixação
de indenização decorrente de dano extra patrimonial. Não se trata de reparação efetiva,
mas de compensação, já que é imensurável monetariamente o abalo psicológico
sofrido pelo lesado.
É cediço que a indenização por dano moral, além de
prestar uma satisfação em relação à vítima, sem fomentar um enriquecimento sem
causa, também tem caráter punitivo e pedagógico em relação ao autor da
infração, no sentido de que a indenização deve ser uma forma de inibir novas
práticas da espécie.
A jurisprudência vem adotando esse entendimento,
com a indicação de que o magistrado deve estar atento aos critérios da
proporcionalidade e da razoabilidade, e observar as circunstâncias do caso
concreto, como por exemplo, as capacidades econômicas do ofensor e do ofendido,
a extensão do dano e o caráter pedagógico da indenização.
Na presente ação, é certo que a autora
experimentou desagrado, incômodo ao ter que buscar o Judiciário para enfim ter
seu pedido apreciado, além de sofrer com a suspensão do benefício, situação que
extrapola o mero aborrecimento, em vista da natureza alimentar da verba.
Dessa forma, considerando os fatos ocorridos, e à
míngua de demais dados, fixo o dano moral no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil
reais), quantia esta que é suficiente para desestimular a reiteração do ato
e, em contrapartida, não configura enriquecimento sem causa da autora.
Juros e correção monetária
A contar do evento danoso (dezembro de 2019)
deverá incidir O IPCA-E até 08/12/2021, quando deverá incidir a taxa SELIC a
título de atualização monetária e juros de mora, em conformidade com o art. 3º,
da Emenda Constitucional 113/21 (09/12/2021):
Art. 3º
Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública,
independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de
remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório,
haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa
referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado
mensalmente.
Registro que a fixação da indenização em valor
inferior ao pretendido não acarreta a sucumbência da parte autora, uma vez que
a quantia apontada na inicial deve ser entendida como mera estimativa. Neste
sentido:
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO,
com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo
Civil, para condenar o
INSS ao pagamento de danos morais ao autor no valor de R$ 5.000,00
(cinco mil reais), corrigidos conforme exposto na fundamentação.
Sem custas e honorários advocatícios (art. 55,
caput, da Lei n. 9.099/95).
Publicada e registrada eletronicamente.
***
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