Supremo reconhece direito de benefício mais vantajoso a segurado do INSS

 RECURSO EXTRAORDINÁRIO 630.501 - DIREITO AO MELHOR BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.

...ao segurado deve ser reconhecido direito ao melhor benefício de aposentadoria...

 

O direito adquirido ao melhor benefício implica a possibilidade de o segurado ver o seu benefício deferido ou revisado de modo que corresponda à maior renda possível no cotejo entre a renda mensal inicial obtida e as rendas mensais que estaria percebendo, naquele momento, se houvesse requerido em algum momento anterior o benefício, desde quando possível a aposentadoria proporcional.



Em análise ao Recurso Extraordinário (RE) 630501, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceram, por maioria dos votos (6x4), o direito de cálculo de benefício mais vantajoso a segurado do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), desde que já preenchidas as condições para a concessão da aposentadoria. A matéria, que discute o alcance da garantia constitucional do direito adquirido, teve repercussão geral reconhecida.

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 630.501 RIO GRANDE DO SUL

RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE

 

APOSENTADORIA – PROVENTOS – CÁLCULO. Cumpre observar o quadro mais favorável ao beneficiário, pouco importando o decesso remuneratório ocorrido em data posterior ao implemento das condições legais. Considerações sobre o instituto do direito adquirido, na voz abalizada da relatora – ministra Ellen Gracie –, subscritas pela maioria.

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A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal em prover parcialmente o recurso extraordinário, nos termos do voto da Ministra Ellen Gracie e por maioria, em sessão presidida pelo Ministro Joaquim Barbosa, na conformidade da ata do julgamento e das respectivas notas taquigráficas.

Brasília, 21 de fevereiro de 2013.

 

RELATÓRIO

A Senhora Ministra Ellen Gracie: Cuida-se de recurso extraordinário interposto por aposentado pelo regime geral de previdência contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com fundamento no art.102, III, a, da Constituição Federal.

 

O requerente alega que teria sido violada a garantia constitucional do direito adquirido", pois foi indeferida sua pretensão de ver o benefício calculado do modo mais vantajoso, consideradas todas as datas de exercício possíveis desde o preenchimento dos requisitos para a aposentadoria.

 

Não foram apresentadas contrarrazões.

 

A repercussão geral da matéria foi reconhecida por esta Corte em outubro de 2010.

 

O Ministério Público ofereceu parecer opinando pelo desprovimento do recurso.

 

É o relatório.

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ADITAMENTO AO VOTO

A Senhora Ministra Ellen Gracie (Relatora) - Presidente, é sempre, para nós, uma satisfação ouvirmos sustentações orais como a que acabamos de ouvir, produzidas por integrantes da advocacia pública que, com esse entusiasmo, com essa garra, com todo esse conhecimento de causa, vêm defender as causas que dizem respeito ao erário público, ao dinheiro público, como ele é gasto, como ele é despendido e como ele deve ser bem aplicado.

 

Creio que a ilustre Procuradora foi muito feliz em assinalar que esse é um caso muito importante, porque, eventualmente, a sua solução trará um descompasso nas contas da Previdência Social.

 

E ele é importante também, Presidente - por isso eu o trouxe, por isso eu coloquei à repercussão geral, porque há muitos e muitos trabalhadores aposentados, nas mesmas condições, exercendo a mesma função, com o mesmo salário do seu vizinho, que percebem uma renda hoje, vamos supor de cem, enquanto o vizinho recebe cento e vinte, por conta de um se haver aposentado em março, o outro em abril, maio ou junho.

 

Esse fator realmente é empiricamente com provável. São milhares de aposentadorias nessas circunstâncias e é importante que o Tribunal, de uma vez por todas, estabeleça qual o critério a ser seguido: se há, realmente, um direito ao melhor benefício de aposentadoria ou se os cálculos, assim como feitos pela Presidência, estão corretos.

 

Passo ao voto.

Revisão após Ação Trabalhista - Material 

VOTO

A Senhora Ministra Ellen Gracie (Relatora):

 

1. Cuida-se de Recurso Extraordinário em que o recorrente busca a reforma de acórdão do Egrégio Tribunal Regional Federal da 4º Região que teria violado a garantia constitucional do direito adquirido ao considerar improcedente a pretensão do segurado da previdência social de ver seu benefício de aposentadoria recalculado para que prevaleça data de início de benefício anterior à efetiva, por lhe ser mais vantajoso. Está configurada, pois, a hipótese do art. 102, III, a, da CF.

 

O dispositivo constitucional invocado no recurso extraordinário (art. 5°, XXXVI) foi considerado pelo acórdão recorrido, de modo que dou por satisfeito o requisito do pré-questionamento (Enunciados 282 e 356 da Súmula deste Tribunal).

 

A repercussão geral da matéria, por sua vez, foi suscitada em preliminar específica e restou reconhecida por esta Corte no âmbito do Plenário Virtual, em outubro de 2010.

 

O recurso está apto, assim, para ter o seu mérito analisado.

 

2. Faz-se necessário compreender com clareza a pretensão do recorrente. Busca ele ver reconhecido o direito de que a renda inicial da sua aposentadoria seja a maior possível, para tanto cotejando-se os cálculos e reajustes que teriam sido feitos caso o benefício tivesse sido requerido em mês anterior, quando já cumpridos os requisitos. Para tanto, invoca a garantia do direito adquirido, estampada no art. 5º, XXXVI, da Constituição. Assim o faz com base também no art. 58 do ADCT, que determinou a recomposição dos benefícios tendo como referência o número de salários-mínimos a que correspondiam na época da concessão.

 

3. A garantia constitucional do direito adquirido está estampada no artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

 (...).

XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.  

 

O instituto do direito adquirido insere-se, normalmente, nas questões de direito intertemporal. Não temos, no nosso direito, uma garantia ampla e genérica de irretroatividade das leis, mas a garantia de que determinadas situações Jurídicas consolidadas não serão alcançadas por lei nova. Assegura-se, com isso, a ultratividade da lei revogada em determinados casos, de modo que o direito surgido sob sua vigência continue a ser reconhecido e assegurado.

 

Pontes de Miranda,[1] comentando a Constituição anterior - cujo art. 153, § 3º , trazia a mesma fórmula -, já destacava que a lei nova não pode prejudicar os direitos emanados de fatos pretéritos, considerados adquiridos, “isto é, os direitos já irradiados e os que terão de irradiar-se”.

 

Celso Ribeiro Bastos[2] dá destaque a outra perspectiva, esclarecendo que, ao se assegurar o direito adquirido, o que se protege “não é o passado, mas sim o futuro”.

 

Continua: “0 direito adquirido consiste na faculdade de continuar a extraírem-se efeitos de um ato contrários aos previstos pela lei atualmente em vigor, ou, se preferirmos, continuar-se a gozar dos efeitos de uma lei 'pretérita mesmo depois de ter ela sido revogada. [...]” o direito adquirido envolve muito mais uma questão de permanência da lei no tempo, projetando-se, destarte, para além da sua cessação de vigência, do que um problema de retroatividade.”

 

4. Em matéria previdenciária, já está consolidado o entendimento de que é assegurado o direito adquirido sempre que, preenchidos os requisitos para o gozo de determinado benefício, lei posterior revogue o dito benefício, estabeleça requisitos mais rigorosos para a sua concessão ou, ainda, imponha critérios de cálculo menos favoráveis.

 

É que, nessas situações, coloca-se a questão da supressão, de um direito já incorporado ao patrimônio do segurado e constitucionalmente protegido contra lei posterior, que, no dizer do art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição, não pode prejudicá-lo.

 

Ao longo do tempo, diversas alterações no regime geral de previdência social sobrevieram.

 

Mas, normalmente, houve a preservação expressa dos direitos adquiridos e, até mesmo, o estabelecimento de normas de transição que procuraram fazer uma conciliação entre as expectativas dos segurados e a possibilidade de o Estado alterar o regime jurídico das prestações sociais.

 

A EC 20/98, que estabeleceu a aposentadoria por tempo de contribuição em lugar da antiga aposentadoria por tempo de serviço, ressalvou; “Art. 3° - É assegurada a concessão de aposentadoria e pensão, a qualquer tempo, aos servidores públicos e aos segurados do regime geral de previdência social, bem como aos seus dependentes, que, até a data da publicação desta Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente”.

 

A Lei 9.876/99, que criou o fator previdenciário, por sua vez, também ressalvou os direitos adquiridos:

 

Art. 6º É garantido ao segurado que até o dia anterior à data de publicação desta Lei tenha cumprido os requisitos para a concessão de benefício o cálculo segundo as regras até então vigentes”.

 

Quando a lei nova menos favorável não ressalva os direitos adquiridos e a Administração não os respeita, esta Corte os assegura, dando efetividade à garantia constitucional.

 

A jurisprudência é firme no sentido de que, para fins de percepção de benefício, aplica-se a lei vigente ao tempo da reunião dos requisitos. Dá-se aplicação, assim, ao Enunciado 359 da Súmula do Tribunal:

 

Ressalvada a revisão prevista em lei os proventos da inatividade regulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil, reuniu os requisitos necessários”.

 

Sua redação está alterada em conformidade com o decidido no RE 72.509, em que foi destacado que o fato de o segurado “não haver requerido a aposentadoria não o faz perder seu direito”.

 

Embora elaborada a partir de casos relacionados a servidores públicos, aplica-se a toda a matéria previdenciária, conforme já reconhecido por este tribunal por ocasião do julgamento do RE 243.415-9, relator o Min. Sepúlveda Pertence:

 

(...) a Súmula se alicerçou em julgados proferidos a respeito da aposentadoria de funcionários públicos; mas a orientação que o verbete documenta não responde a problema que diga respeito a peculiaridade do seu regime e sim aos da incidência da garantia constitucional do direito adquirido”.

 

5. O que este Supremo Tribunal Federal não reconhece é o direito adquirido a regime jurídico, ou seja, não considera abrangido pela garantia constitucional a proteção de simples expectativas de direito.

 

Também não admite a combinação dos aspectos mais benéficos de cada lei com vista à criação de regimes híbridos.

 

Efetivamente, resta consolidado que não há direito adquirido a regime jurídico de modo a tutelar simples expectativas e que não é possível combinar regimes para colher o melhor de cada qual (AgRegAI 655.393, Min. Carmen Lúcia, set/09; AI 654.807, de minha relatoria, jun/09) ou pretender submeter à lei antiga fatos posteriores à lei nova

 

(“Embora tenha o recorrente direito adquirido à aposentadoria, nos termos do art. 3º da EC 20/98, não pode computar tempo de serviço posterior a ela, valendo-se das regras vigentes antes de sua edição.” Pleno, RE 575.089, Ricardo Lewandowski, set/08).

 

6. O presente recurso extraordinário traz à consideração uma outra questão. Discute-se se, sob a vigência de uma mesma lei, teria o segurado direito a escolher, com fundamento no direito adquirido, o benefício mais vantajoso consideradas as diversas datas em que o direito poderia ter sido exercido.

 

Em outras palavras, o recurso versa sobre a existência ou não de direito adquirido ao cálculo da renda mensal inicial (RMI) com base em data anterior a do desligamento do emprego ou da entrada do requerimento (DER) por ser mais vantajoso ao beneficiário.

 

Não estamos, pois, frente a uma questão de direito intertemporal, mas diante da preservação do direito adquirido frente a novas circunstâncias de fato.

 

Cabe, aqui, com fundamento no próprio Enunciado 359, distinguir a aquisição do direito do seu exercício.

 

Cumpridos os requisitos mínimos (tempo de serviço e carência ou tempo de contribuição e idade, conforme o regime jurídico vigente à época), o segurado adquire o direito ao benefício.

 

Não é por outra razão, aliás, que o § 1º do art. 102 da Lei 8.213/91, incluído pela Lei 9.528/97, por exemplo, reconhece:

 

A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos”.

 

É que a alteração posterior nas circunstâncias de fato (por exemplo, a cessação dos recolhimentos por longo período, com a perda da qualidade de segurado) não suprime o direito já incorporado ao patrimônio do seu titular.

 

O segurado pode exercer o seu direito assim que preenchidos os requisitos para tanto (assim que adquirido) ou fazê-lo mais adiante, normalmente por optar em prosseguir na ativa, inclusive com vista a obter aposentadoria integral ou, atualmente, para melhorar o fator previdenciário aplicável.

 

A questão está em saber se o não-exercício imediato do direito, assim que cumpridos os requisitos, pode implicar prejuízo ao seu titular.

 

Tenho que, uma vez - incorporado o direito à aposentação ao patrimônio do segurado, sua permanência na ativa não pode prejudicá-lo. Efetivamente, ao não exercer seu direito assim que cumpridos os requisitos mínimos para tanto, o segurado deixa de perceber o benefício mensal desde já e ainda prossegue contribuindo para o sistema.

 

Não faz sentido que, ao requerer o mesmo benefício posteriormente (aposentadoria), o valor da sua renda mensal inicial seja inferior àquela que já poderia ter obtido.

 

Admitir que circunstâncias posteriores possam implicar renda mensal inferior àquela garantida no momento do cumprimento dos requisitos mínimos é permitir que o direito adquirido não possa ser exercido tal como adquirido.

 

Afinal, o benefício - previdenciário constitui-se na fruição de proventos mensais que amparam o segurado em situação de inatividade. O direito ao benefício é o direito a determinada renda mensal, calculada conforme os critérios jurídicos e pressupostos fáticos do momento em que cumpridos os requisitos para a sua percepção.

 

7. Normalmente, o fato de permanecer na ativa e a circunstância de prosseguir contribuindo são favoráveis ao segurado, mas eventualmente podem não ser.

 

A obtenção de renda mensal inicial inferior àquela que o segurado já poderia ter obtido se requerido o benefício em meses anteriores, desde o cumprimento dos requisitos mínimos, pode decorrer de circunstâncias não apenas jurídicas como fáticas:

 

jurídicas, quando inovação legislativa implique benefício menor; fáticas, quando a consideração do período decorrido desde a aquisição do direito até o desligamento do emprego ou requerimento afete negativamente o cálculo, por força dos seus critérios próprios.

 

O regime previdenciário tem cunho contributivo, de modo que as contribuições vertidas repercutem no valor do benefício, juntamente com outras circunstâncias como a idade e a expectativa de vida.

 

Mesmo antes de a aposentadoria passar a ser um benefício concedido por tempo de contribuição, de seu cálculo passar a considerar a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo e, ainda, de estar sujeito ao fator previdenciário (índice calculado com base na idade, expectativa de sobrevida e tempo de contribuição), já se exigia do segurado não apenas tempo de serviço, mas também um período de carência (número de contribuições), sendo o benefício calculado com base nas últimas trinta e seis contribuições.   

 

A opção por permanecer em atividade, portanto, sempre implicou a possibilidade de exercer o direito à aposentadoria mediante o computo também das contribuições vertidas desde o cumprimento dos requisitos mínimos para a aposentação até a data do desligamento do emprego ou do requerimento.

 

Tal custeio adicional após a obtenção do direito à aposentadoria proporcional mínima ou mesmo após a aquisição do direito à integralidade sempre foi e é considerado por ocasião do cálculo e deferimento do benefício de aposentadoria.

 

Embora seja, via de regra, vantajoso para aquele que permaneceu na ativa ter contribuído ao longo de mais alguns meses ou anos, pode não sê-lo em circunstâncias específicas como a da redução do seu salário-de-contribuição, com influência negativa no cálculo da renda mensal inicial.

 

Em tais casos, mesmo que a diminuição não decorra de lei, mas dos novos elementos considerados para o cálculo do benefício, impende assegurar-se o direito adquirido ao melhor benefício possível.

 

Destaco que o legislador, atualmente, já vai ao encontro desse objetivo ao determinar, no art. 122 da Lei 8.213/91, com a redação da Lei 9.528/97, que:

 

Se mais vantajoso, fica assegurado o direito à aposentadoria, nas condições legalmente previstas na data do cumprimento de todos os requisitos necessários à obtenção do benefício, ao segurado que, tendo completado 35 anos de serviço, se homem, ou trinta anos, se mulher, optou por permanecer em atividade”.


Embora o dispositivo legal se refira ao cumprimento dos requisitos para a aposentadoria integral ao assegurar o benefício mais vantajoso, tal deve ser assegurado também na hipótese de a aposentadoria proporcional se apresentar mais vantajosa.

 

8. O benefício de aposentadoria caracteriza-se por uma prestação mensal de caráter permanente, substitutiva dos rendimentos do segurado e concedida a este quando lhe advenha incapacidade laboral definitiva ou quando reúna tempo de contribuição associado à idade.

 

A proporcionalidade e a integralidade são simples critérios de cálculo do benefício de aposentadoria e não elementos essenciais capazes de caracterizar benefícios distintos.

 

O direito à aposentadoria, surge já por ocasião de preenchimento dos requisitos mínimos para a aposentação proporcional. Após, o prosseguimento na ativa e as respectivas contribuições vão ensejando, a possibilidade de aposentação com renda mais elevada, até a integralidade do benefício.

 

Não olvido que esta Corte tem decisões no sentido de que:

 

O beneficiário, ao ter sua aposentadoria concedida com proventos integrais, não poderá requerer que a sua renda mensal seja calculada de acordo com a legislação em vigor na data em que teria direito à aposentadoria proporcional”. (AgRRE345.398). No mesmo sentido, o AgRRE 297.375.

 

Todavia, é momento de revisar tal posição, porquanto o reconhecimento do direito adquirido ao benefício mais vantajoso, ainda que proporcional, se impõe.

 

Quando os requisitos para a aposentadoria proporcional tiveram sido cumpridos, cabe reconhecer a possibilidade de que seja exercido o direito, ainda que tardiamente. É o que destacou o Min. Carlos Velloso ao decidir o RE 269.407:

 

... se há reunião de todos os requisitos para a aposentadoria, opera-se, de imediato, aquisição do direito, irrelevante a circunstância de não ter o titular exercido o direito que lhe competia”.

 

9. O direito adquirido ao melhor benefício implica a possibilidade de o segurado ver o seu benefício deferido ou revisado de modo que corresponda à maior renda possível no cotejo entre a renda mensal inicial obtida e as rendas mensais que estaria percebendo, naquele momento, se houvesse requerido em algum momento anterior o benefício, desde quando possível a aposentadoria proporcional.

 

Recalcula-se o benefício fazendo retroagir hipoteticamente a DIB (Data de Início do Benefício) à data em que já teria sido possível exercer o direito à aposentadoria e a cada um dos meses posteriores em que renovada a possibilidade de exercício do direito, de modo a verificar se a renda seria maior que a efetivamente obtida por ocasião do desligamento do emprego ou do requerimento. Os pagamentos, estes sim, não retroagem à nova DIB, pois dependentes do exercício do direito.

 

O marco para fins de comparação é, pois, a data do desligamento ou do requerimento original, sendo considerado melhor benefício aquele que corresponda, à época, ao maior valor em moeda corrente nacional.

 

Observados tais critérios, se a retroação da DIB não for mais favorável ao segurado, não há que se admitir a revisão do benefício, ainda que se invoque conveniência decorrentes de critérios supervenientes de recomposição ou reajuste diferenciado dos benefícios.

 

Não poderá o contribuinte, pois, pretender a revisão do seu benefício para renda mensal inicial inferior, sob o fundamento de que, atualmente, tal lhe seria vantajoso, considerado o art. 58 do ADCT, que determinou a recomposição dos benefícios anteriores à promulgação da Constituição de 1988 considerando tão-somente a equivalência ao salário mínimo.

 

O fato de art. 58 do ADCT ter ensejado que benefício inicial maior tenha passado a corresponder, em alguns casos, a um benefício atual menor é inusitado, mas não permite a revisão retroativa sob o fundamento do direito adquirido.

 

A invocação do direito adquirido, ainda que implique eleitos futuros, exige que se olhe para o passado. Modificações legislativas posteriores não justificam a revisão pretendida, não servindo de referência para que o segurado pleiteie retroação da DIB (Data de início do Benefício).

 

Isso não impede, contudo, que a revisão da renda mensal iniciai pela retroação da DIB, com base no melhor benefício à época do requerimento, tenha implicações na revisão de que tratou o art. 58 do ADCT, mas como mero efeito acidental que justifica o interesse atual do segurado na revisão.

 

10. Destaco que o recurso extraordinário do segurado é oriundo do Tribunal Regional da 4ª  Região, mas que, atualmente, também o entendimento daquela Corte foi consolidado em favor da tese do direito adquirido ao melhor benefício, conforme se vê nos Embargos Infringentes 2008.71.00.016366-9/RS, relator para o acórdão o Desembargador João. Batista Pinto Silveira, julgado em outubro de 2010.

 

Ademais, já há, inclusive, decisões monocráticas no âmbito deste Supremo Tribunal Federal aplicando o entendimento do Enunciado 359 da Súmula deste Tribunal a casos como o ora trazido.

 

Refiro-me, por exemplo, ao RE 572620/SP, relator o Ministro Carlos Britto, julgado em 29 de março deste ano de 2010, quando proveu recurso extraordinário para reformar acórdão que negara o reconhecimento de direito adquirido ao melhor benefício.

 

A decisão de Sua Excelência inclusive já transitou em julgado. Veja-se seu teor:

 

DECISÃO: Vistos, etc. Trata-se de recurso extraordinário, interposto com suporte na alínea 'a' do inciso III do art. 102 da Constituição Republicana, contra, acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Acórdão assim ementado (fls. 62):

 

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIOS. RENDA MENSAL. PERÍODO BÁSICO DE CÁLCULO. ARTIGOS 21, II DA CLPS E 29 CAPUT DA LEI Nº 8.2012/91. MELHOR SALÁRIO-DE-BENEFÍCIO - DIREITO ADQUIRIDO - INEXISTÊNCIA,

 

I - A regra de apuração do período básico de cálculo vincula-se à data do afastamento das atividades ou do requerimento benefício, conforme previsões dos artigos 21, II da CLPS e 29, caput da Lei n. 8.213/91.

 

II - O INSS está adstrito ao princípio da legalidade administrativa e, à falta de expressa previsão legal de direito ao melhor salário-de-benefício, só lhe cabe cumprir o texto da lei em sua precisa formulação de alcance amplo e extensivo.

 

III - Benefício concedido quando, ainda não se encontrava em vigor o artigo 122 da Lei nº 8.213/91 na redação da Lei n.º 9.528/97, que constitui ato jurídico perfeito e imodificável.

 

IV - O direito adquirido- vislumbra-se no tocante ao benefício em si inexistindo quanto ao valor da aposentadoria, o qual guarda relação de dependência, com o exercício do direito e consequentemente com os requisitos do afastamento da atividade ou apresentação do requerimento.

 

V - Recurso improvido.”

 

2. Pois bem, a parte recorrente alega violação ao inciso XXXVI do art. 5º da Carta Magna de 1988. 

 

3. A seu turno, a Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do Subprocurador Geral Rodrigo Janot Monteiro de Barros opina pelo provimento do apelo extremo.

 

4. Tenho que a insurgência merece acolhida. Isso porque o aresto impugnado destoa da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Leia-se, a propósito, a ementa do RE 266.927, sob a relatoria do ministro Ilmar Galvão:

 

PREVIDENCIÁRIO. PROVENTOS DA APOSENTADORIA CALCULADOS COM BASE NA LEGISLAÇÃO VIGENTE AO TEMPO DA REUNIÃO DOS REQUISITOS QUE TODAVIA FORAM CUMPRIDOS SOB O REGIME DA LEI ANTERIOR, EM QUE O BENEFÍCIO TINHA POR BASE VINTE SALÁRIOS DE CONTRIBUIÇÃO EM VEZ DE DEZ ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DO DIREITO ADQUIRIDO.

 

Hipótese a que também se revela aplicável e até com maior razão em face de decorrer o direito de contribuições pagas ao longo de toda a vida laboral - a Súmula 359, segundo a qual os proventos da inatividade se regulam pela lei vigente ao tempo em  que reunidos os requisitos necessários à obtenção do benefício, não servindo de óbice à pretensão do segurado, obviamente, a circunstância de haver permanecido em atividade por mais alguns anos, nem o fato de a nova lei haver alterado o lapso de tempo de apuração dos salários de contribuição, se nada impede compreenda ele os vinte salários previstos na lei anterior.

 

Recurso conhecido e provido.

 

5. Outros precedentes: AIs 585.775, sob a relatoria do ministro Gilmar Mendes: e 704.656, sob a relatoria do ministro Ricardo Lewandowski; bem como RE 559.242, sob a relatoria do ministro Cezar Peluso.

 

Isso posto, e frente ao § 1º-A do art. 557 do CPC, dou provimento ao recurso. Invertidos os ônus da sucumbência ".

 

11. Para que se tenha uma ideia mais clara dos efeitos da tese ora acolhida, passo a indicar dados e números exemplificativos.

 

A época da aposentadoria do recorrente, por exemplo, o salário-de-benefício correspondia a 1/36 (um trinta e seis avos) da soma dos salários-de-contribuição imediatamente anteriores ao mês do afastamento da atividade, até o máximo de 36 (trinta e seis), apurados em período não superior a 48 (quarenta e oito) meses, nos termos do art. 37 do Decreto 83.080/1979.

 

Esse o período base de cálculo. O MPAS indicava coeficientes de reajustamento dos salários de contribuição anteriores aos 12 (dozes) últimos para fins de cálculo do salário de benefício, conforme o § 1º do mesmo art. 37.

 

Mas a Súmula 2 do TRF4 determinava a aplicação dos índices da OTN/ORTN, e a Súmula 260 do extinto Tribunal Federal de Recursos determinava o primeiro reajuste integral.

 

O benefício que o autor vem recebendo, com Data de Início do Benefício em 01/11/1980 (a rescisão de trabalho foi em 30/09/1980 e gozou ainda de um mês de aviso prévio com contribuição), teve como Renda Mensal Inicial o valor de Cr$ 47.161,00 (quarenta e sete mil, cento e sessenta e um cruzeiros).


A alteração da DIB para 01/10/1979 (data do preenchimento dos requisitos) implica consideração de outro período base de cálculo e dos respectivos salários-de-contribuição, anteriores a tal data, os quais, atualizados, apontam salário-de-benefício superior e consequente renda mensal inicial melhor que a obtida originariamente, configurando, pois, melhor benefício.

 

Há reflexo, ainda, na equivalência salarial, justificando o interesse do autor na revisão.  

 

Considerando a nova DIB e a evolução da renda com 1º reajuste integral, o valor do benefício, em 11/1980, seria de R$ 53.916,00, maior, portanto, que a RMI de concessão.

 

Os efeitos reflexos para fins de aplicação do art. 58 do ADCT, por sua vez, também são positivos, porquanto a equivalência ao salário-mínimo passaria de 8,15 para 9,31 salários.

 

O aumento na renda mensal inicial tem repercussão na renda mensal atual, implicando sua revisão e pagamento de atrasados, observada a prescrição.

 

As considerações numéricas ora efetuadas são para fins exclusivos de exemplificação, não dispensando, por certo, a elaboração de cálculos por ocasião de liquidação de sentença e a solução das questões que eventualmente vierem a ser suscitadas quanto aos critérios que não constituem o objeto específico da questão, constitucional do direito adquirido ao melhor benefício, ora analisada.


12. Ante todo o exposto, dou parcial provimento ao recurso extraordinário.

 

Atribuo os efeitos de repercussão geral ao acolhimento da tese do direito adquirido ao melhor benefício, assegurando-se a possibilidade de os segurados verem seus benefícios deferidos ou revisados de modo que correspondam à maior renda mensal inicial possível no cotejo entre aquela obtida e as rendas mensais que estariam percebendo na mesma data caso tivessem requerido o benefício em algum momento anterior, desde quando possível a aposentadoria proporcional, com efeitos financeiros a contar do desligamento do emprego ou da data de entrada do requerimento, respeitadas a decadência do direito à revisão e a prescrição quanto às prestações vencidas. Aplica-se aos recursos sobrestados o regime do art. 543-B do CPC.

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 630.501 RIO GRANDE DO SUL

VOTO-VISTA

 

O SENHOR MINISTRO DIAS TOFFOLI: Trata-se de recurso extraordinário interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que rejeitou a pretensão do recorrente no sentido de que fossem recalculados, de modo mais vantajoso, seus proventos de aposentadoria, consideradas todas as datas de exercício possíveis, desde o preenchimento dos requisitos legais para a sua concessão.

 

Para tanto, asseverou que, independentemente da data do requerimento, o direito ao benefício nasceria no momento da implementação de seus requisitos legais, a partir de quando, haveria a aquisição do direito, o qual, se viesse a ser posteriormente exercido, deveria considerar os aspectos mais vantajosos ao interessado.

 

A eminente Relatora do feito, Ministra Ellen Gracie, proferiu magnífico voto dando parcial provimento ao recurso, com fundamento na efetiva violação, no caso, do direito adquirido do recorrente.

 

Assegurou, assim, que o recorrente pudesse ter seus benefícios deferidos ou revisados de modo a obter a maior renda mensal inicial possível, no cotejo entre aquela obtida e as rendas mensais que estaria percebendo na mesma data caso tivesse requerido o benefício em algum momento anterior em que já fosse possível a aposentadoria proporcional.

 

Pedi vista dos autos para melhor analisar a matéria em discussão nestes autos. Com a vênia da eminente Ministra Relatora, apresento voto divergente, pois penso que a solução mais adequada para a controvérsia aqui instaurada é aquela já alvitrada pela instância de origem.

 

Concordo com a eminente Ministra Relatora quando afirma estar consolidado, na jurisprudência desta Suprema Corte, o entendimento de que é assegurado o direito adquirido sempre que, preenchidos os requisitos para o gozo de determinado benefício, lei posterior venha a revogá-lo, a estabelecer requisitos mais rigorosos para a sua concessão, ou ainda, a impor critérios de cálculo menos favoráveis ao titular do benefício.

 

Porém, nada disso ocorreu no caso ora submetido à apreciação deste Plenário, conforme, aliás, reconhecido pela própria Ministra Relatora, que deixou destacado, em seu cuidadoso voto, que

 

o presente recurso extraordinário traz à consideração uma outra questão. Discute-se se, sob a vigência de uma mesma lei, teria o segurado direito a escolher, com fundamento no direito adquirido, o benefício mais vantajoso consideradas as diversas datas em que o direito poderia ter sido exercido. Em outras palavras, o recurso versa sobre a existência ou não de direito adquirido ao cálculo da renda mensal inicial (RMI) com base em data anterior à do desligamento do emprego ou da entrada do requerimento (DER) por ser mais vantajoso ao beneficiário”.

 

Feita essa introdução ao tema controverso, asseverou Sua Excelência que “não estamos, pois, frente a uma questão de direito intertemporal, mas diante da preservação do direito adquirido frente a novas circunstâncias de fato”.

 

Ora, assim colocados os fatos em discussão nestes autos, parece irrefutável a conclusão de que a hipótese aqui narrada não pode ser qualificada como violação de um direito adquirido do recorrente.

 

Conforme igualmente destacado pelo voto da Relatora, o instituto do direito adquirido insere-se, normalmente, nas questões de direito intertemporal; mas, convém rememorar, disso não se está a tratar na análise do presente caso.

 

Inviável, destarte, dar-se provimento ao recurso extraordinário ora em apreciação com fundamento em alegada violação do direito adquirido do recorrente.

 

Nesse passo, convém destacar que não se ignora que a jurisprudência desta Corte entende que questões referentes a alegadas ofensas a direito adquirido, ou mesmo a ato jurídico perfeito, configuram situações de ofensa meramente reflexa ao texto constitucional, insuscetíveis de discussão, portanto, em recurso extraordinário.

 

Porém, no caso presente, o Plenário Virtual desta Suprema Corte entendeu que a matéria aqui em discussão apresenta relevância jurídica, pois se está a exigir definição quanto ao alcance da garantia constitucional do direito adquirido, bem como quanto à sua possível invocação independentemente de alteração legislativa entre o seu surgimento e seu exercício, tendo em conta alterações de ordem fática ou repercussões jurídicas supervenientes.

 

Decidiu, também, aquele colegiado que a matéria tem relevância social, por poder influir na revisão de benefícios previdenciários de milhões de segurados.

 

Destarte, parece mesmo adequada a efetiva discussão acerca da violação desse princípio constitucional no caso presente, mas reitero meu entendimento de que isso não ocorreu na hipótese ora em discussão.

 

Pelo contrário, eventual alteração do cálculo da renda mensal inicial do recorrente, a ser efetuada da forma como por ele postulada, configuraria inegável desrespeito ao ato jurídico perfeito estabelecido quando da concessão da aposentadoria, que decorreu de pleito voluntário que apresentou, aliás, vários anos antes do ajuizamento da presente ação.

 

Isso porque, conforme já destacado alhures, não houve alteração legislativa entre a data em que o requerente reuniu as condições de postular a concessão do benefício previdenciário de que é titular e aquela em que efetivamente veio a postular, formalmente, sua concessão.

 

Dentro dessa perspectiva, o que houve foi a opção do recorrente em postular, em determinada data, a concessão do benefício previdenciário em tela (aposentadoria por tempo de serviço), devendo ser ressaltado que foi dele a escolha quanto a essa data, quando efetivamente exerceu o direito que lhe assistia de pleitear e, consequentemente, obter a aposentadoria – o que, de fato, se consumou.

 

O fato de que o requerimento pudesse ter sido apresentado em tempo pretérito não pode ser transmudado em direito adquirido a ser protegido pelo ordenamento jurídico pátrio, até porque – reitere-se – não houve alteração legislativa, entre as datas pertinentes, que pudesse acarretar prejuízo aos interesses do recorrente.

 

A jurisprudência desta Suprema Corte não tem admitido a alteração de atos de aposentadoria, em hipóteses similares a esta aqui em discussão, quando o titular do benefício constata que, se houvesse apresentado requerimento em data anterior, o valor de seus proventos seria superior.

 

Nesse sentido, e apenas para ilustrar, transcrevo a ementa do julgamento proferido pela Primeira Turma desta Corte nos autos do AI nº 810.744/RS:

 

“AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA INTREGRAL. TRANSFORMAÇÃO. APOSENTADORIA PROPORCIONAL AO TEMPO DE SERVIÇO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.

I – Tendo o autor optado, por sua exclusiva conveniência, pela aposentadoria integral, não pode a sua renda mensal ser calculada em data anterior, quando fazia jus à aposentadoria proporcional ao tempo de serviço. Precedentes.

 

II - Não há qualquer contrariedade à Súmula 359 do STF, porquanto tal enunciado pressupõe alterações legislativas previdenciárias, os quais importem em evidente prejuízo ao beneficiário que cumpriu os necessários requisitos à inatividade, em momento anterior, quando havia legislação mais favorável ao segurado. Precedente.

 

III - Agravo regimental improvido”

 

(Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de 1º/2/11).

 

De sua fundamentação, porque pertinente à solução da controvérsia instaurada nestes autos, destaco o seguinte trecho:

 

“Nesse quadro, o agravante, ao ter sua aposentadoria concedida com proventos integrais, obteve àquilo que se esperava do INSS, qual seja, a observância da legislação regente ao tempo em que cumprido os requisitos legais para a jubilação. Dessa forma, tendo o autor optado, por sua exclusiva conveniência, pela aposentadoria integral, não pode a sua renda mensal ser calculada em data anterior, quando fazia jus à aposentadoria proporcional ao tempo de serviço.

 

Outra não foi a solução dada por essa Suprema Corte, cujo entendimento fixou-se no sentido de que o segurado ao qual foi deferida a aposentadoria integral não poderá requerer que a sua renda mensal seja calculada de acordo com a legislação em vigor na data em que teria direito à aposentadoria proporcional. Confira-se, nesse sentido, os seguintes julgados dessa Corte:

 

Agravo regimental em recurso extraordinário.

 

2. Aposentadoria com proventos integrais em conformidade com a lei vigente ao tempo da reunião dos requisitos para a concessão. Pretensão do desfazimento do ato que o aposentou para lavrar-se outro, com proventos proporcionais, por entender mais favorável. Impossibilidade. Precedentes.

 

3. Agravo regimental a que nega provimento

 

(RE 297.375-AgR/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma).

 

‘CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA.

 

I. - Aposentadoria concedida com proventos integrais, tendo em consideração o preenchimento dos requisitos legais exigidos. Pretensão de transformação do benefício com proventos proporcionais: impossibilidade.

 

II. - Negativa de trânsito ao RE. Agravo não provido’ (RE 352.391-AgR/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, Segunda Turma).

 

Seguindo essa linha de raciocínio, menciono, ainda, as seguintes decisões: RE 466.142/SC, Rel. Min. Joaquim Barbosa e RE 593.549/SP, Rel. Min. Eros Grau.

 

Por fim, imperioso salientar que não há qualquer contrariedade à Súmula 359 do STF, porquanto tal enunciado pressupõe alterações legislativas previdenciárias, os quais importem em evidente prejuízo ao beneficiário que cumpriu os necessários requisitos à inatividade, em momento anterior, quando havia legislação mais favorável ao segurado. Daí o direito adquirido à observância da lei regente ao tempo da reunião dos requisitos da inatividade.

 

É o que se extrai do julgamento do RE 243.415-AgR/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Veja-se:

 

Inafastáveis, ademais, os fundamentos trazidos na decisão recorrida, que restaram intocados pelos argumentos apresentados pelo recorrente. Permito-me transcrever o seguinte excerto daquela decisão:

 

“Não há fundamento jurídico para a modificação do ato de concessão da aposentadoria do autor, a pretexto de conveniência pessoal.

 

De fato, não alegou vício na manifestação de vontade de aposentar-se, nem ilegalidade no procedimento de concessão do benefício; não incide a regra do artigo 122 da Lei nº 8.213, de 1991, por ser superveniente à concessão do seu benefício; nem, de resto, houve ofensa a direito adquirido, em decorrência de nova lei, cujas regras fossem restritivas a direito, em comparação com aquelas vigentes à época em que completados os requisitos do benefício.

 

Ademais, a pretensão vai de encontro ao interesse público na estabilização das relações jurídicas entre os segurados e a Previdência Social, e esbarra no princípio da legalidade, uma vez que não existe autorização lega para a revisão da aposentadoria, a pedido do beneficiário, sem que se aponte ilegalidade ou vício no procedimento ou no próprio ato de concessão” (fls. 118v/119).

 

Também não se pode deixar de mencionar, neste julgamento, a posição adotada pelo Plenário desta Suprema Corte no julgamento do RE nº 415.454/SC, da relatoria do eminente Ministro Gilmar Mendes, de cuja ementa transcrevo os seguintes trechos:

 

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INTERPOSTO PELO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), COM FUNDAMENTO NO ART. 102, III, “A”, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, EM FACE DE ACÓRDÃO DE TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO: PENSÃO POR MORTE (LEI Nº 9.032, DE 28 DE ABRIL DE 1995)

 

(...)

 

8. Levantamento da jurisprudência do STF quanto à aplicação da lei previdenciária no tempo. Consagração da aplicação do princípio tempus regit actum quanto ao momento de referência para a concessão de benefícios nas relações previdenciárias. Precedentes citados:

 

RE no 258.570/RS, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 19.4.2002; RE (AgR) no 269.407/RS, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 2.8.2002; RE (AgR) no 310.159/RS, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 6.8.2004; e MS no 24.958/DF, Pleno, unânime, Rel. Min. Marco Aurélio, DJ 1o.4.2005. 9.

 

Na espécie, ao reconhecer a configuração de direito adquirido, o acórdão recorrido violou frontalmente a Constituição, fazendo má aplicação dessa garantia (CF, art. 5º, XXXVI), conforme consolidado por esta Corte em diversos julgados:

 

RE no 226.855/RS, Plenário, maioria, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 13.10.2000; RE no 206.048/RS, Plenário, maioria, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. p/ acórdão Min. Nelson Jobim, DJ 19.10.2001; RE 298.695/SP, Plenário, maioria, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 24.10.2003; AI (AgR) no 450.268/MG, 1ª Turma, unânime, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 27.5.2005;

 

RE (AgR) 287.261/MG, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 26.8.2005; e RE 141.190/SP, Plenário, unânime, Rel. Ilmar Galvão, DJ 26.5.2006. 10. De igual modo, ao estender a aplicação dos novos critérios de cálculo a todos os beneficiários sob o regime das leis anteriores, o acórdão recorrido negligenciou a imposição constitucional de que lei que majora benefício previdenciário deve, necessariamente e de modo expresso, indicar a fonte de custeio total (CF, art. 195, § 5º). Precedente citado: RE 92.312/SP, 2ª Turma, unânime, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 11.4.1980.

 

(...)

 

13. O cumprimento das políticas públicas previdenciárias, exatamente por estar calcado no princípio da solidariedade (CF, art. 3º, I), deve ter como fundamento o fato de que não é possível dissociar as bases contributivas de arrecadação da prévia indicação legislativa da dotação orçamentária exigida (CF, art. 195, § 5º).

 

Precedente citado: julgamento conjunto das ADI´s no 3.105/DF e 3.128/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, Red. p/ o acórdão, Min. Cezar Peluso, Plenário, maioria, DJ 18.2.2005.

 

14. Considerada a atuação da autarquia recorrente, aplica-se também o princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial (CF, art. 201, caput), o qual se demonstra em consonância com os princípios norteadores da Administração Pública (CF, art. 37).

 

15. Salvo disposição legislativa expressa e que atenda à prévia indicação da fonte de custeio total, o benefício previdenciário deve ser calculado na forma prevista na legislação vigente à data da sua concessão (...) (DJe de 26-10-2007).

 

Dadas as lições contidas em sua fundamentação, merece parcial atenção o seguinte trecho do voto proferido pelo eminente Ministro Ricardo Lewandowski naquele julgamento:

 

“Assiste razão à autarquia previdenciária, porque entendo, com a devida vênia, equivocada qualquer interpretação que se faça de uma norma com desconsideração do ordenamento jurídico em que ela está inserida.

 

Em nosso sistema legal de cunho romanístico, vigora, como regra de hermenêutica básica, a obediência ao princípio da hierarquia das leis, razão pela qual apenas em uma situação excepcional poderá juiz resolver uma controvérsia sem recorrer a uma norma preestabelecida, hipótese em que lança mão, no dizer de Bobbio, de um ‘juízo de equidade’.

 

Se o fizer fora do contexto de uma situação excepcional, estará produzindo um direito além do limite material imposto pelas normas hierarquicamente superiores, subvertendo, em consequência, a própria estrutura normativa imposta pelo ordenamento jurídico.

 

No caso dos autos, o julgador, ao dar uma interpretação à lei em que atribui a alguém um direito sem expressa autorização normativa, à evidência, está criando um novo direito e, consequentemente, atuando na anômala condição de legislador positivo. E isso, o Supremo Tribunal Federal sempre rejeitou (RE 322.348 AgR/SC, Rel. Min. Celso de Mello; ADI 2554 AgR/DF, Rel. Min. Maurício Corrêa; ADI 1949 MC/RS, Rel. Min. Sepúlveda Pertence).

 

Não se mostra possível, portanto, concessa venia, aplicar-se a uma relação jurídica já consumada as alterações legislativas posteriores relacionadas ao cálculo da renda previdenciária mensal, inicialmente determinada, sejam elas mais ou menos benéficas ao segurado ou dependente deste.

 

De outra parte, não há que se cogitar, penso eu, de aplicação imediata da lei às prestações futuras, ou ao que se denomina de facta pendentia decorrentes de eventos passados, pois, em verdade, tais prestações decorrem do fato gerador único que é o evento morte.

 

E o benefício que lhe sucede é regido pela lei vigente à época deste fato.

 

Impõe-se, portanto, a aplicação à espécie do princípio tempus regit actum.

 

(...)

 

Ademais, em se tratando de normas previdenciárias, cumpre levar em consideração, sem prejuízo de reconhecer-se o seu caráter assistencial, a exigência imposta pelo texto constitucional de que os benefícios delas decorrentes tenham viabilidade financeira.

 

Com efeito, a regra do art. 195, § 5º, da CF, que prevê a existência de uma fonte de custeio, não se dirige apenas ao legislador, mas também ao aplicador da norma previdenciária.

 

Desconsiderá-la, a ponto de conferir a alguém um benefício não previsto expressamente em lei, repita-se, é subverter o regime ao qual ela se submete, tornando inviável o próprio sistema no transcorrer do tempo.

 

Sobre essa questão, convém trazer à baila significativa passagem do voto proferido pelo eminente Ministro Nelson Jobim na ADI 3.105, que examinou a constitucionalidade da contribuição sobre os proventos de aposentadoria, criada pela EC 41/2003:

 

‘A ideia do equilíbrio atuarial determina que o sistema previdenciário como um todo deve ter viabilidade econômico-financeira para o futuro e no futuro.

 

Portanto, o equilíbrio atuarial não remete à noção de direitos e deveres individuais e, assim, não significa que toda contribuição deve ter uma causa eficiente (...)

É isto que significa o princípio do equilíbrio atuarial:

 

um cálculo matemático com regras de probabilidade, ou seja, uma especialidade da matemática que trabalha exatamente com as ações de futuro, absolutamente nada a ver com as relações entre haver pago e ter direito a receber

(...)

se tivéssemos que ter, a todo aumento ou criação de contribuições e tributo, um benefício subsequente, é evidente que não teríamos, em hipótese alguma, a possibilidade de trabalhar nesse sentido.’

 

Desse mesmo julgamento, extraio ponderação não menos significativa do eminente Ministro Cezar Peluso:

 

‘(...) reafirmo a velha convicção de que a esta Corte não cabe a tarefa de, sob os mais nobres propósitos, substituir-se aos órgãos republicanos competentes para legislar e para definir políticas públicas, nem tampouco de se fazer intérprete de aspirações populares que encontram, nas urnas, o instrumento constitucional de expressão e decisão.

 

Pesa-lhe apenas a tarefa, de não menor nobreza e relevância no Estado Democrático de Direito, de velar pela Constituição, guardando-lhe, como elaboração e patrimônio da consciência jurídica nacional em dado momento histórico, todos os valores, princípios e normas que a compõem como um sistema de conexão de sentidos, cuja vocação última é o de tutelar a dignidade da pessoa humana.’

 

É bem verdade que o eminente Ministro Eros Grau registrou que as alterações impostas pela Lei 9.032/95 não contemplam qualquer fonte de custeio, asseverando o seguinte:

 

‘... salvo a hipótese de que a Corte decidir pela inconstitucionalidade desse artigo 3º - o que não está em debate nesta oportunidade – não me parece possa ser tida como inconstitucional a aplicação dos preceitos da Lei n. 9.032/95 a benefícios de pensão por morte concedidos em momento anterior a sua vigência, desde então

(...)

 até a vigência da Lei n. 9.528/97, atualmente vigente, que pelas mesmas razões acima desenvolvidas aplica-se imediatamente à situação de que se cuida.’

 

Ocorre que, a meu sentir, a vedação prevista no art. 195, § 5º, da CF não significa que toda a lei instituidora de benefício previdenciário tenha, obrigatoriamente, de prever, de forma expressa, a respectiva fonte de custeio.

 

Com efeito, as leis previdenciárias, como é o caso daquela sob análise, gozam da presunção de que os parâmetros que emprestam viabilidade ao sistema foram observados.

 

Tal presunção tem como um de seus fundamentos o princípio do equilíbrio atuarial do sistema, que, conforme se verificou da transcrição de passagem do voto do eminente Ministro Nelson Jobim, objetivam a ‘viabilidade econômico-financeira para o futuro e no futuro’.

(...)” (DJe de 26/10/07).

 

Pelas razões apresentadas, com a devida vênia da eminente Ministra Relatora, ouso divergir de seu posicionamento, reafirmando, assim, que a jurisprudência da Corte, em matéria semelhante, deve ser mantida, não se mostrando possível o “reconhecimento do direito adquirido ao benefício mais vantajoso, ainda que proporcional”, proposto em seu voto.

 

Nessa conformidade, voto pelo não provimento do recurso.

 

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 630.501 RIO GRANDE DO SUL

 

O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO – Presidente, Vossa Excelência me permite? O Verbete nº 359 versa, é certo, sobre servidores, mas, a meu ver, está baseado no mesmo princípio que rege este conflito.

 

O Verbete revela que:

 

Ressalvada a revisão prevista em lei, os proventos da inatividade regulam-se pela lei vigente ao tempo em que o militar, ou o servidor civil, reuniu os requisitos necessários, inclusive a apresentação do requerimento, quando a inatividade for voluntária.

 

O que retrata a espécie? O contribuinte alcançou condições para se aposentar, tendo em conta o salário-contribuição, em certa data. Prosseguiu no mercado e, posteriormente, teve emprego que não rendeu como o anterior.

 

Indago: aposentado a partir das contribuições alusivas aos últimos salários, tem ou não o direito à ultratividade da lei para alcançar o recálculo dos proventos da aposentadoria segundo as condições atendidas anteriormente?

 

Minha resposta é positiva, no sentido do voto da relatora.

 

Adianto inclusive o ponto de vista para, com a devida vênia do ministro Dias Toffoli, acompanhar Sua Excelência, a relatora, provendo, portanto, o recurso.

 

A situação não se confunde com aquela outra que trouxe a julgamento em que, após aposentado, veio o prestador dos serviços a lograr novo emprego em patamar remuneratório maior e saber se, tendo contribuído normalmente, tem jus apenas ao salário-família e ao auxílio reclusão, como previsto em lei, sendo o primeiro direito, também, dos aposentados, consoante o artigo 65 da Lei nº 8.213/91, ou se tem direito ao recálculo dos proventos. A situação é diversa.

 

EXTRATO DE ATA

RECURSO EXTRAORDINÁRIO 630.501

PROCED.: RIO GRANDE DO SUL

RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE

REDATOR DO ACÓRDÃO RISTF: MIN. MARCO AURÉLIO

RECTE.(S): CENSURADO

ADV.(A/S): DAISSON SILVA PORTANOVA E OUTRO(A/S)

RECDO.(A/S): INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS

PROC.(A/S)(ES): PROCURADOR-GERAL FEDERAL

 

Decisão: Após o voto da Senhora Ministra Ellen Gracie (Relatora), provendo parcialmente o recurso, pediu vista dos autos o Senhor Ministro Dias Toffoli. Falou pelo recorrido a Dra. Luysien Coelho Marques Silveira, Procuradora do INSS. Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso.

 

Plenário, 23.02.2011.

 

Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Ministra Ellen Gracie (Relatora), deu parcial provimento ao recurso, vencidos os Ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Votou o Presidente, Ministro Joaquim Barbosa. Redigirá o acórdão o Ministro Marco Aurélio. Não votou a Ministra Rosa Weber por suceder a Ministra Ellen Gracie. Plenário, 21.02.2013.

 

Presidência do Senhor Ministro Joaquim Barbosa. Presentes à sessão os Senhores Ministros Celso de Mello, Marco Aurélio, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Luiz Fux, Rosa Weber e Teori Zavascki.

 

Procurador-Geral da República, Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos.

 

p/ Luiz Tomimatsu

Assessor-Chefe do Plenário

 

Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/autenticarDocumento.asp sob o número 3467586.


***

 


[1] (Comentários à Constituição de 1967; com a Emenda n. I, de 1969. 3ª  ed. Tomo V. Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 67).

[2]  (Comentários à Constituição do Brasil, 2o  vol. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 192).


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